Estudo mostra diversidade na estrutura e contextualização de dezenas de iniciativas que visam cortar as emissões de gases do efeito estufa em todos os continentes.
A Associação Internacional de Comércio de Emissões (IETA), que representa mais de 150 empresas envolvidas no mercado de carbono, divulgou nesta terça-feira (12) seu relatório anual ‘Mercado de Gases do Efeito Estufa 2013’, avaliando os principais avanços na precificação do carbono ao redor do mundo.
A IETA constatou um crescente número de ações governamentais para lidar com as mudanças climáticas através de abordagens de mercado, passando pela Califórnia, China, Coreia do Sul, Cazaquistão, África do Sul e outros.
As projeções atuais indicam que, em dois ou três anos, quase um quarto das emissões mundiais do setor de energia e indústrias estará em jurisdições com precificação do carbono (Figura ao lado), apesar de alguns obstáculos encontrados na Austrália e nos Estados Unidos.
“Estamos preparados para uma arrancada no crescimento da precificação do carbono”, comemorou Dirk Forrister, presidente da IETA.
Ele notou que, no caso do mercado europeu (EU ETS), cujo valor das permissões de emissão está em apenas €5/t, é preciso lembrar que o esquema ainda está no início, “então é importante manter a base e continuar construindo uma infraestrutura forte para as próximas décadas”.
A publicação defende que a tendência de expansão no número de iniciativas deve ter um papel importante nas negociações internacionais, inclusive na COP 19, que está sendo realizada na Polônia, e que o mecanismo chamado Framework for Various Approaches (FVA) traz a oportunidade de conectar os mercados de carbono.
“No âmbito das Nações Unidas, as empresas precisam de uma estrutura que ofereça confiança para negociar unidades de carbono internacionalmente”, colocou Jeff Swartz, diretor de políticas da IETA.
Diversidade
As iniciativas de precificação do carbono são, de fato, muito diversas, e isso pode criar inconsistências, especialmente em relação aos preços relativos ao corte nas emissões. Porém, ressalta a IETA, a diversidade pode, de muitas maneiras, significar força, permitindo que diferentes abordagens sejam tentadas e muitas lições sejam aprendidas.
Apesar da diversidade, muitos elementos em comum estão surgindo nas novas iniciativas compiladas pelo relatório. Por exemplo, a maioria aceita o uso de compensações, variando muito em quantidade, tipo e local de origem.
Na América do Norte, a publicação constatou que as compensações tendem a ter origem doméstica. Já na União Europeia (UE), Austrália (até o momento) e no Japão, os créditos internacionais são bem-vindos.
A cobertura das emissões dos esquemas também varia muito, com alguns restritos a grandes emissores (UE e China) e outros ampliando o leque de entidades abrangidas (Califórnia e Quebec, que incluem a partir de 2015 o setor de transportes).
A abordagem para compensar o aumento dos custos devido à limitação das emissões do setor de geração de eletricidade vai desde a compensação direta, como na UE, até a alocação de permissões gratuitas para as distribuidoras, como na Califórnia.
capaieta2013 IETA identifica forte tendência de precificação do carbono ao redor do mundoNo caso da Califórnia, Dirk Forrister, presidente da IETA, enxerga uma expansão do mercado em 2014 devido à conexão com a província canadense de Quebec. Ele nota que neste esquema existem alguns fatores interessantes que aproveitam oportunidades muito além de Quioto, como a elegibilidade de créditos da destruição de substâncias nocivas à camada de ozônio.
Califórnia e Quebec parecem ser um dos poucos exemplos em que, de fato, a conexão entre diferentes esquemas está sendo efetivada. Assim, a IETA está organizando uma iniciativa chamada ‘Parceria Empresarial para a Preparação dos Mercados’ – similar a um esquema criado pelo Banco Mundial – visando contribuir com a compreensão do que é necessário para estabelecer novos mercados de carbono e ter maior unidade.
Em nível internacional, as discussões sobre o FVA e os Novos Mecanismos de Mercados devem lidar com essa questão.
O Japão é outro caso de destaque, segundo Forrister. O Mecanismo de Creditação Conjunta “está juntando tecnologia, clima e políticas de desenvolvimento”, criando uma alternativa ao MDL para o período 2013-2020.
O esquema está adaptando metodologias do MDL e fechando acordos bilaterais – especialmente com países asiáticos – para aplicá-las em troca de créditos de compensação de emissões usados internamente.
Outro exemplo de aprendizado com as lições passadas dos mecanismos pioneiros, como o EU ETS e o MDL, é a aplicação de mecanismos para conter os preços do carbono, o que já está previsto na Califórnia, no Quebec e na Iniciativa Regional de Gases do Efeito Estufa (RGGI). A Coreia está também está avaliando ferramentas para responder a mudanças rápidas nos preços.
Novos esquemas
Outros países anunciaram recentemente que também estão desenvolvendo esquemas alternativos, com características próprias, para lidar com o crescimento das emissões de gases do efeito estufa.
A África do Sul, por exemplo, tem planos de implantar uma taxa de ZAR 120/tCO2 (€ 8,6) sobre fontes estacionárias de emissões a partir de janeiro de 2015. Apesar de o país ter optado por uma taxa e não um mercado, a iniciativa inclui elementos de um comércio de emissões, como os créditos de compensação.
“É surpreendente como, na prática, não há dicotomia entre o mercado [de emissões] e as taxas, mas sim um espectro de possibilidades de desenho disponível para os reguladores, que permitem que os benefícios do mercado sejam concretizados”, nota o relatório.
Apenas créditos de projetos domésticos, certificados pelo MDL, VCS ou Gold Standard, serão aceitos como compensação na África do Sul.
Na China, em meio a grandes expectativas, a província de Shenzhen deu o chute inicial nas negociações de carbono já em junho. Nos primeiros três meses, o preço do carbono em Shenzhen subiu de 30 RMB (€3,6) para 90 RMB (€11).
Porém, ainda é muito cedo para dizer por que o mercado reagiu dessa forma e se o preço continuará nesse nível ao longo do tempo, comentou Wu Qian, da embaixada britânica em Pequim, em um artigo no relatório.
Nas outras seis províncias que a China pretende iniciar o comércio de emissões, as atividades estão evoluindo, especialmente em Xangai e Guangdong. Juntos, os sete esquemas incluem 25% do PIB e 21% do consumo de energia chinês.
Em maio de 2012, outro gigante asiático entrou para o rol de países com propostas de comércio de emissões. A Coreia do Sul – oitavo maior emissor de gases do efeito estufa do mundo – deve ter o seu esquema ativo em 2015, cobrindo 500 instalações não apenas do setor industrial, mas também de transportes, agricultura, grandes edificações e resíduos.
“O esquema de comércio de emissões da Coreia será o primeiro em um país fora do Anexo I (do Protocolo de Quioto), e o volume [equivalente a cerca de 60% das emissões totais do país] deve exceder tanto o da Austrália quanto o da Califórnia”, disse Dalwon Kim, representante da Comissão Europeia.
Financiamento
Outra questão tratada no relatório é o avanço em relação ao financiamento de ações climáticas. A IETA defende que o papel do setor privado é essencial para alavancar recursos, e que isso pode ser incentivado através de ferramentas como o Fundo Verde do Clima e da precificação do carbono – com o uso de créditos de compensação.
Instrumentos tradicionais como o MDL e a Implementação Conjunta também devem ter papéis importantes, assim como a redução das emissões por desmatamento e degradação (REDD+), conclui a IETA.
No caso do REDD+, o relatório argumenta que é preciso adotar uma abordagem flexível e ampla para o financiamento do mecanismo e sugere que se aproveitem exemplos de sucesso de fora do setor florestal para alcançar resultados significativos – como um tipo de tarifa ‘feed-in’ para as florestas.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.
(CarbonoBrasil)