Universo Energético
Palmito de pupunha aumenta renda ao agricultor e ajuda a proteger a Mata Atlântica
Foto: Daniele Otto
Hoje, só no Paraná, são 650 agricultores familiares envolvidos no cultivo de pupunha, em 1.750 hectares. Muitos produtores estão substituindo o tradicional cultivo de banana pela pupunha e em alguns locais já foram implantadas agroindústrias. O pesquisador Álvaro Figueredo dos Santos, da Embrapa Florestas, explica: “Optamos pela pupunha porque sua produção é sustentável. É uma espécie que tem capacidade de perfilhar, ou seja, continuar produzindo palmito”.
O sistema de produção “Pupunha para palmito na agricultura familiar” tem proporcionado resultados importantes às comunidades em que é adotado e acaba de receber o Certificado de Tecnologia Social da Fundação Banco do Brasil.
O Brasil é um dos maiores produtores e consumidores de palmito no mundo. No entanto, sua produção ainda é baseada na exploração de espécies nativas, como a juçara, nativa da Mata Atlântica, e o açaí, nativo da Floresta Amazônica. A extração dessas espécies tem contribuído para sua extinção, em especial da juçara, que morre após a colheita do palmito. A pupunha, nativa da região amazônica (onde é cultivada para produção de frutos), tem se mostrado uma alternativa para cultivo de palmito com sustentabilidade econômica e ambiental nas regiões leste do Paraná, Santa Catarina e São Paulo, estados onde um amplo projeto de pesquisa e desenvolvimento adaptou o cultivo dessa espécie para a agricultura familiar.
Além de perfilhar, a pupunha tem a vantagem de ser precoce, pois começa a produzir palmito 18 meses após o plantio e continua produzindo por pelo menos mais 10 anos. A rusticidade, vigor e produtividade da planta também são itens apreciados pelos produtores rurais. “Outro diferencial”, complementa Álvaro, “é que o palmito não escurece rapidamente após o corte, o que constitui uma vantagem em relação às demais palmeiras e possibilita a venda in natura, com maior valor agregado”.
É o caso de Geraldo Moraes Bertucci. Há dez anos ele investiu no plantio de pupunha e hoje possui uma agroindústria para beneficiamento do palmito. “Trabalhava como empregado até 2011, mas em 2004 comecei a planejar um ‘plano b’. Após levantamento de várias opções, cheguei à pupunha, porque eu podia continuar trabalhando e fazer o cultivo simultaneamente”. Bertucci explica que há um grande mercado para o produto no Brasil, além de um mercado externo enorme. Hoje, o produtor comercializa a pupunha in natura e em conserva, com uma produção de seis toneladas por mês. Em 32 hectares, ele cultiva 160 mil pés de pupunha. “Atualmente, estou com uma produção que gera boa rentabilidade com excelente qualidade”, finaliza.
A pupunha no Paraná
O extensionista da Emater (PR) Sebastião Bellettini acompanhou todo o processo de introdução da pupunha no estado. “A pupunha tem potencial para expandir ainda mais. Muitos agricultores estão substituindo bananais em fase de declínio de produção pela pupunha. Além disso, também estão sendo aproveitadas com boa produtividade áreas de pastagens abandonadas e outras que não eram mais cultivadas dentro das propriedades”, explica.
A comercialização para as indústrias é feita em haste ou por quilograma de produto produzido. A forma in natura geralmente é comercializada em supermercados, restaurantes e lanchonetes no litoral e em Curitiba. “O mercado de pupunha in natura tende a aumentar, já que é um produto natural sem qualquer aditivo químico ou conservante”, explica Bellettini. O extensionista explica que é um cultivo que utiliza pouca mão de obra e com isso uma família tem condições de cultivar aproximadamente três hectares ou 15 mil covas, ocupando uma pequena área de plantio com boa rentabilidade.
Atualmente o preço por haste está em torno de R$ 3,00, o que significa uma renda aproximada de R$ 9 mil por hectare ao ano. Bellettini completa: “O palmito pupunha forma um grande tripé: é um produto social, por ocupar mão de obra familiar; econômico, por gerar boa renda na propriedade; e ambientalmente correto, por reduzir o corte do palmito-juçara”.
O interesse por essa cultura tem aumentado a cada ano. Em 2004, na região litoral do Paraná, havia um milhão de mudas de pupunheira plantadas em pequenas propriedades rurais, representando cerca de 200 hectares. Em 2007, esse número aumentou para aproximadamente 2,2 milhões de mudas plantadas, o equivalente a uma área cultivada de 440 hectares, o que representa um aumento de mais de 100%. Hoje são 1.600 hectares. Pesquisas indicam que o cultivo da pupunha pode se expandir para diversas regiões brasileiras, em especial regiões quentes e sem deficit hídrico.
Um dos grandes ganhos da adoção dessa palmeira para o cultivo de palmito é o ambiental, destaca o extensionista Cirino Corrêa Jr., da Emater (PR), uma vez que não existem sistemas sustentáveis suficientemente testados e passíveis de utilização pelos agricultores familiares no aproveitamento de áreas abandonadas no ‘Domínio da Mata Atlântica’, que é onde estão os produtores. Ele explica que o modelo de subsistência, praticado pelos agricultores de baixa renda, não promove o desenvolvimento socioeconômico de seus usuários e essa prática favorece o êxodo rural e a exploração extrativista predatória dos recursos disponíveis nessa área: “Por suas características, a pupunha é uma excelente opção para a agricultura familiar, podendo ser cultivada isoladamente ou consorciada com outras culturas, o que a torna sustentável do ponto de vista socioeconômico”.
O projeto de pesquisa
A adaptação de uma cultura em outra região exige um amplo trabalho de pesquisa e desenvolvimento. Desde o ano 2000, diversas instituições têm trabalhado para que o sistema de produção da pupunha seja viável, com pesquisas nas mais diversas frentes: estudo de mercado, zoneamento, manejo, melhoramento genético e conservação de germoplasma, processamento. Essas ações foram desenvolvidas com produtores rurais, agroindustriais e com a assistência técnica rural.
Álvaro Figueredo explica que os experimentos foram instalados preferencialmente em áreas de produtores, com a participação de extensionistas, o que ampliou o alcance dessas ações nas comunidades e possibilitou que os resultados obtidos fossem rapidamente incorporados aos sistemas produtivos.
Além do sistema de produção, o projeto entendeu que nos últimos 50 anos o consumo de palmito no Brasil esteve sempre associado ao produto envasado, cujo processamento na maioria das vezes é inacessível ao produtor, que tem como única opção, atualmente, repassar sua produção para a indústria de enlatados a preços mínimos. Por sua vez, o alto preço do produto envasado reduz o consumo desse produto.
Em busca de novas maneiras de comercialização e utilização do palmito, o projeto tem estudado formas de consumo, tais como o uso de filmes comestíveis para comercialização do palmito in natura; a produção de espaguete de palmito, em parceria com a Embrapa Agroindústria de Alimentos; a utilização dos resíduos atualmente descartados pela indústria como alimentos ricos em fibras, em parceria com a Universidade Estadual de Ponta Grossa.
A importância do palmito
O Brasil, além de ser o maior produtor e consumidor de palmito, é também, hoje, o maior exportador mundial do produto, responsável por aproximadamente 95% de toda a produção do palmito consumido no mundo, sendo 90% de origem extrativista, proveniente do açaí (da Amazônia) e da juçara (da Mata Atlântica). O setor brasileiro de palmito tem um faturamento anual estimado em US$ 350 milhões, com a geração de 8 mil empregos diretos e 25 mil empregos indiretos. Segundo o analista Joel Penteado Jr., “estima-se que o mercado mundial gire em torno de US$ 500 milhões, com grande potencial de crescimento. No entanto, a falta de escala e o beneficiamento precário do produto refletem em baixa qualidade e alto custo do produto no mercado”. Isso faz com que os principais importadores estejam reduzindo as compras do Brasil, que perde mercado para a Costa Rica, cuja produção de palmito de pupunha é de origem cultivada.
Essa lacuna cria uma oportunidade do cultivo de pupunha para promover o fortalecimento e o crescimento da economia de municípios que apresentem potencial para a produção em pequena propriedade. O analista conclui: “Investir neste novo mercado é importante para o desenvolvimento do agronegócio nacional. Novas agroindústrias estão surgindo. Investimentos para a padronização e valorização das marcas estão sendo feitos. E todo esse processo ajuda a desestimular o consumo clandestino e ilegal, que acontece há anos e resulta no desmatamento de áreas nativas da Mata Atlântica”. Os produtores do litoral paranaense já têm sentido esses benefícios. “A comercialização in natura chega a agregar mais de 100% do valor pago ao produtor pela indústria, que, por sua vez, paga cerca de R$ 2,00 por unidade, enquanto o palmito fornecido diretamente ao consumidor pode chegar a R$ 5,00 a unidade”, revela Penteado Jr.
Todos os trabalhos de pesquisa e desenvolvimento que tratam da produção de palmito de pupunha no Sul do Brasil contam com a participação de parceiros que atuam em rede, cada um dentro de sua linha de trabalho: centros de pesquisa da Embrapa – Florestas, Agroindústria de Alimentos, Soja e Milho e Sorgo; Universidade Federal do Rio de Janeiro; Universidade Estadual de Maringá; Universidade Estadual de Ponta Grossa; Universidade Federal do Paraná; Faculdades Integradas Espírita; Pontifícia Universidade Católica do Paraná; Universidade Federal de Minas Gerais; Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater/PR; Instituto Agronômico do Paraná (Iapar); Fundação Municipal 25 de Julho (SC); Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina; Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios – Apta Vale do Ribeira; Coordenadoria de Assistência Técnica Integral de São Paulo (Cati);. Também participam empresas privadas: Voight Alimentos (Joinville/SC); Indústria e Comércio de Conservas Alimentícias Vale do Ribeira (Registro/SP); e Viveiros Flora do Vale (Eldorado/SP); além da Associação dos Produtores de Pupunha do Vale do Ribeira (Apuvale) e Associação Brasileira das Indústrias do Palmito Pupunha.
Por Katia Pichelli (MTb 3594/PR), Embrapa Florestas, in EcoDebate, 27/08/2015
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