UGAS Hidrocarbonos sem controles ambientais, péssima mistura para a África
Calcula-se que Uganda tenha reservas equivalentes a US$ 2 bilhões de barris de petróleo. Os especialistas ambientais temem que para muitos países africanos falte a capacidade para explorar os hidrocarbonos com riscos mínimos para o ambiente. Foto: Wambi Michael/IPS

Nairóbi, Quênia, 31/10/2014 – Os economistas têm a esperança de que as recentes descobertas de importantes reservas de gás natural e petróleo em vários países africanos, entre eles Quênia, Tanzânia e Uganda, ajudem o continente a expandir e diversificar sua economia, em grande parte agrícola. Mas ecologistas e especialistas em mudança climática que estão a favor das energias renováveis recomendam que se pare a prospecção desses hidrocarbonos, temendo que para muitos países africanos falte capacidade para extraí-los com risco mínimo para o ambiente.
As preocupações ambientais não definem as políticas econômicas, afirmou à IPS Hadley Becha, diretor da organização Ação Comunitária para a Conservação da Natureza, do Quênia. Embora o mundo esteja se afastando do consumo dos combustíveis fósseis, “a prospecção e produção de petróleo e gás continuarão”, enquanto os recursos naturais da África, em particular esses hidrocarbonos, estão sob controle das transnacionais, acrescentou.
Como muitos especialistas, Becha acredita que os governos africanos seguirão concedendo autorização de exploração a essas empresas porque a indústria extrativista mostra grande potencial de geração de renda.
Segundo a KPMG Africa, uma rede de firmas de serviços profissionais, até 2012 haviam sido descobertas reservas de 124 bilhões de barris de petróleo no continente, com potencial adicional de cem bilhões de barris no leito do mar. Em 2010, havia 16 países africanos exportadores de petróleo, mas espera-se que ao menos cinco outros – Gana, Quênia, Moçambique, Tanzânia e Uganda – se somem à lista em breve.
Mas o ecologista queniano Wilbur Otichillo considera que, devido à mudança de atitude em relação aos combustíveis fósseis, sobretudo nas sociedades do Norte industrial, “o petróleo recém-descoberto continuará debaixo da terra. A maioria das empresas que receberam concessões para realizar prospecção na África oriental é ocidental”. É provável que estas deem atenção aos defensores da energia limpa, “especialmente porque, seguramente, serão indenizadas pelos investimentos que fizeram na prospecção”, acrescentou.
Mas, ao contrário do Egito, que tem políticas específicas de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) para a prospecção dos diferentes hidrocarbonos, muitos países africanos, entre eles o Quênia, só têm uma classificação de EIA, segundo Becha. O setor é muito especializado e exige uma regulamentação minuciosa e específica de impacto ambiental, acrescentou. Por exemplo, no Quênia a prospecção e produção de petróleo e gás são regidas pela arcaica lei do petróleo, de 1984, que foi parcialmente modificada em 2012. Essa lei “é fraca, sobretudo quanto aos pagamentos, e também mantém silêncio sobre a gestão do gás”, explicou.
Os especialistas alertam que os combustíveis fósseis terão um impacto importante nos padrões climáticos. O último informe do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática (IPCC), publicado em setembro, considera provável que a temperatura suba de maneira considerável na África. Segundo Becha, “deveria haver regras específicas” para prospecção e produção, transporte, armazenamento e comercialização dos diversos produtos, refino e processamento dos hidrocarbonos em produtos utilizáveis, como a gasolina.
O diretor da Fundação África Verde, John Kioli, disse à IPS que o Quênia se comprometeu a adotar tecnologia com menos emissões de dióxido de carbono, um dos gases que provocam o efeito estufa que aquece o planeta. “Por exemplo, o carvão será extraído sob a terra e não a céu aberto”, explicou.
Kioli, o ideólogo por trás da lei de Autoridade da Mudança Climática 2012 do Quênia, destacou a necessidade de abordar a questão da governança e da legislação na África. Embora o continente tenha se comprometido a adotar medidas de adaptação e mitigação da mudança climática, “carece dos recursos necessários. A África não pode continuar se socorrendo do leste e oeste por estes recursos de forma indefinida”, destacou.
O governo do Quênia calcula que o Plano Nacional de Ação Contra a Mudança Climática (2013-2017) exigirá investimento de US$ 12,76 bilhões, equivalentes a todo o orçamento nacional para este ano. Mas Danson Mwangangi, economista e pesquisador da África oriental, apontou à IPS que, para alcançar o crescimento e o desenvolvimento, e dessa forma reduzir a pobreza, o continente “terá que explorar os combustíveis fósseis”.
Os países industrializados são responsáveis por uma grande parte das emissões de gases-estufa e a África “também deve ter sua parte justa” dessas emissões, “mas em um prazo determinado. Não indefinidamente”, disse Myangani. “Em comparação com problemas mais graves, como a luta contra diversas doenças, não se dará prioridade aos projetos de mudança climática”, acrescentou.
Embora continue a busca por petróleo e gás na África, Becha pontuou que os ganhos serão de curto prazo e que é improvável que reativem a economia. “No petróleo e no gás não se trata só das autorizações para exploração, mas também de questões de impostos”, observou Myangani. Diante da ausência de impostos sobre ganhos de capital, como no caso do Quênia e de outros países africanos, “o governo perderá muita renda diante das empresas de prospecção que atuam como intermediárias”, explicou.
Os países africanos deverão criar um fundo solvente para armazenar a renda dos hidrocarbonos a fim de estabilizar a economia. “O petróleo pode inflar os preços de certos produtos básicos, daí a necessidade de controlar os aumentos repentinos da inflação”, afirmou Myangani. Gana é um dos poucos países africanos com um imposto sobre os ganhos de capital e um fundo solvente. Envolverde/IPS
(IPS)