Marcus Meneghetti
ANTONIO PAZ/JCMelgarejo quer mais participação da juventude nas ações da ONG
O engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo foi escolhido para presidir a Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan). Melgarejo é o 9º presidente da entidade desde a fundação, em 1971. Ele assume a presidência com um olhar crítico sobre a atuação da titular da Secretaria Estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Sema), Ana Pellini.
Melgarejo acredita que a política de agilização das licenças ambientais no Estado "estimula práticas irresponsáveis a longo prazo". Além disso, sustenta que o acúmulo de funções de Ana Pellini - que, além de secretária, é presidente da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) - prejudica a credibilidade do órgão técnico.
O dirigente também questiona o projeto do deputado federal gaúcho Luis Carlos Heinze (PP), que desobriga a rotulagem com identificação de produtos transgênicos.
Leonardo Melgarejo, 60 anos, se formou em Agronomia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) em 1976. Trabalhou na Ceasa e na Emater de 1982 até este ano, quando se aposentou. Fez o curso de mestrado em Economia Rural na Ufrgs em 1986.
Segundo o agrônomo, durante os estudos de pós-graduação, convenceu-se de que o desenvolvimento no campo está ligado à formação de uma rede de relações entre diversos pequenos agricultores situados na mesma região. Também foi representante do Ministério de Desenvolvimento Agrário na Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) de 2008 a 2014.
Jornal do Comércio - Como o senhor avalia as medidas que a secretária estadual do Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Ana Pellini, tem tomado para agilizar o processo de licenças ambientais no Rio Grande do Sul?
Leonardo Melgarejo - Todo processo "agilizador" - que usa essa palavra que parece ter uma conotação positiva - estimula ações irresponsáveis a longo prazo. Nos preocupa muito que alguém que está conduzindo interesses da coletividade, em um posto público de relevância para o Estado, afirme que vai tomar medidas para agilizar processos que deveriam ser cautelosos. As implicações não são só econômicas, mas também éticas, ambientais e de saúde pública.
JC - A secretária Ana Pellini acumulou também a presidência da Fepam, que é um órgão técnico. Como o senhor avalia esse acúmulo de funções?
Melgarejo - Isso compromete a credibilidade da articulação entre as instituições, porque a instituição que deveria dar suporte técnico (Fepam) para a instituição política (Sema) é a própria organização política. O conselheiro do agente político é o próprio agente. Em uma situação dessas, dificilmente vamos ter uma manifestação de necessidade de cautela quando houver interesses políticos definidos. Além disso, outras instituições que também estão relacionadas às questões ambientais têm passado por esse processo de enfraquecimento.
JC - Por exemplo...
Melgarejo - Por exemplo, a Emater, que é uma empresa enraizada em todo o Estado, ameaçada com o corte do orçamento promovido por esse governo (de José Ivo Sartori, PMDB), bastante focada na agricultura familiar. E, mais do que isso, a Emater é os olhos e os braços do governo no campo. Com essa instituição enfraquecida, os empreendedores que obtiverem facilidade nas licenças para fazerem seus empreendimentos no meio rural vão agir a descoberto de mais uma alternativa que o Estado tinha para acompanhamento das ações.
JC - Qual o nível de uso de agrotóxicos no Rio Grande do Sul hoje?
Melgarejo - No Brasil, o dado mais citado é de que se usa 5,2 litros ou quilos de agrotóxicos por habitante anualmente. Mas esse dado está desatualizado. Parece que atualmente a média nacional já chega a 6 litros por pessoa/ano. Isso significa que cada brasileiro consome um balde de veneno por ano. Mas essa média é enganosa, porque nas regiões que mais usam, principalmente no Centro-Oeste do País, a quantia gira em torno de 120 litros per capita por ano. Aqui, no Rio Grande do Sul, temos uma condição distinta entre as regiões. Para se ter uma ideia, no Noroeste do Estado, onde existem grandes extensões de plantações de soja, são usados 13 mil litros por quilômetro por ano; mas, no Extremo-Sul do Estado, o uso gira em torno de 0,9 mil litros. Ou seja, no Noroeste do Estado, a média por pessoa/ano é de 30 litros, quase seis vezes mais que a média nacional.
JC - Como o senhor avalia a aprovação do projeto do deputado Luis Carlos Heinze que desobriga o símbolo de transgênico nos rótulos desse tipo de produto?
Melgarejo - Isso é um crime contra os interesses da população. Essa lei que retira a rotulagem dos transgênicos esconde dos consumidores uma informação importante na tomada de decisão sobre que produto vai levar para casa. Quando o deputado Heinze propõe que os transgênicos não sejam mais rotulados com aquele símbolo (um "T" dentro de um triângulo amarelo), impede que todos os analfabetos saibam que estão comprando transgênicos, que todos que tenham problemas de visão, com dificuldades para lerem as letrinhas pequenas, saibam que tipo de alimento estão comprando. Além disso, o projeto dificulta o trabalho do agricultor que quer comercializar um produto limpo, sem transgênicos, porque, para vender um produto como não transgênico, obriga o produtor a fazer uma análise em laboratório de todos os concorrentes transgênicos para provar que nenhum deles está no seu produto.
JC - Qual a avaliação que faz da atuação da Agapan ao longo dessas mais de quatro décadas e quais as projeções para o futuro nas atividades da entidade?
Melgarejo - Entre as instituições não governamentais que tratam da questão ambiental, a Agapan é a mais antiga do Brasil. E ela vem passando por um processo de renovação. E, nesse processo, gostaríamos de convidar a juventude disposta a colaborar com a causa ambiental a procurar o site da Agapan e entrar em contato conosco. Gostaríamos de convidá-la a se filiar a Agapan, a se incorporar nessa disputa que é cada vez mais desigual entre os interesses de curto prazo e as necessidades de longo prazo.