Ter707 Chile1 Terramérica   Fitotecnologia para remediar danos da mineração
A técnica de descontaminação consiste na utilização de sistemas biológicos que atuam como digestores em contraposição aos efeitos contaminantes da mineração. Foto: Cortesia da Universidade de Santiago
Santiago, Chile, 3 de novembro de 2014 (Terramérica).- Enfrentar os embates de seus processos produtivos é um dos desafios da indústria mineradora, de peso determinante no Chile. Agora, pelas mãos de um novo projeto de inovação científica, a mineração poderá passar de uma atividade altamente combatida pelos ambientalistas a uma indústria sustentável em pelo menos alguns de seus processos produtivos.
Trata-se de um projeto de fitotecnologia criado pela doutora Claudia Ortiz, bioquímica da Universidade de Santiago. Mediante o uso de plantas endêmicas, ela e sua equipe de pesquisadores buscam tratar, estabilizar e corrigir solos e águas impactadas por atividades industriais, um processo chamado fitocorreção.
“Essas tecnologias geram uma relevante contribuição ambiental, já que permitem avançar para um desenvolvimento industrial de maneira sustentável, e, ao mesmo tempo, contribuem em matéria social porque permitem enfrentar os efeitos não desejados dos processos produtivos envolvendo a comunidade”, explicou a cientista chilena em entrevista ao Terramérica. “Queremos nos converter em referência mundial desse tipo de solução ambiental inovador”, destacou.
As fitotecnologias se baseiam no uso de plantas e micro-organismos endêmicos, selecionados por seu processo de aclimatação em ambientes explorados economicamente. No Chile, algumas das plantas utilizadas são carqueja (gêneroBaccharis), erva-sal (gênero Atriplex) e a naturalizada caniço (Phragmites australis).
Ortiz iniciou a pesquisa no começo desta década e inicialmente pretendia determinar a razão de algumas espécies vegetais terem a capacidade de crescer em certas condições associadas à má qualidade do solo, por exemplo. “Nos focamos no tema da tolerância a metais, e daí surgiu uma linha que nos permitiu determinar que há algumas espécies vegetais e de micro-organismos que possuem determinadas capacidades para tolerar as condições e, ao mesmo tempo, melhorar os substratos ou os locais impactados”, ressaltou.
A pesquisadora explicou que isso significa que se partiu de uma investigação básica que finalmente se transformou em uma investigação aplicada com um uso concreto. “Nas demonstrações que fizemos no terreno determinamos que há uma melhora na quantidade de matéria orgânica existente em alguns substratos que são quimicamente inertes, que não intervêm no processo de absorção e fixação dos nutrientes”, acrescentou.
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Um exemplo no terreno. Em apenas seis meses se conseguiu reduzir em 30% os sulfatos de águas residuais derivadas do trabalho de mineração. Foto: Cortesia da Universidade de Santiago

Nesse caso, “a melhora vai de zero a 5%, ou de zero a 1%, dependendo do tempo que as plantas estejam incorporadas no sistema”, detalhou Ortiz. “Há melhoria nas propriedades físicas e químicas dos lugares onde estão as plantas, e isso se deve à contribuição dos micro-organismos e das plantas que têm a capacidade de liberar alguns compostos benéficos para o ambiente”, acrescentou.
A tecnologia desenvolvida pela cientista também se aplica ao tratamento de águas, onde as plantas são capazes de capturar elementos metálicos, como o cobre, mobilizando-o nas raízes. “As bactérias podem diminuir em até 30% o conteúdo do sulfato de um resíduo líquido que tenha altas concentrações de sulfato”, ressaltou Ortiz.
Até o momento, os testes-piloto realizados por Ortiz e sua equipe foram realizados exclusivamente sobre substrato de dejetos tóxicos resultantes de processos de mineração. Porém, na experiência em laboratório de viveiro também foram feitas misturas de diferentes tipos de substrato. “No tema das águas, trabalhamos em águas claras, que são os tanques de lavagem, mas hoje em dia estamos fazendo experiências também no terreno, com lixiviado de águas de esgoto onde se depositam os dejetos”, acrescentou a especialista.
A tecnologia desenvolvida por Ortiz já é aplicada no Chile, particularmente em algumas tarefas das estatais Corporação do Cobre do Chile (Codelco) e Empresa Nacional de Mineração. Também está em fase de validação na Bolívia, Colômbia e Canadá. Os resultados preliminares obtidos com a implantação-piloto do sistema “são muito animadores”, afirmou ao Terramérica o gerente de Sustentabilidade e Assuntos Externos da Divisão Chuquicamata da Codelco, Sergio Molina.
“A Codelco tem uma preocupação especial por incorporar permanentemente novas tecnologias para minimizar os impactos causados ao ambiente”, afirmou o gerente da maior mina a céu aberto do mundo e a maior produtora de cobre do país. “Daí temos feito alianças com centros de estudos, como a Universidade de Santiago, para desenvolver projetos-piloto que vão nessa direção e com os quais temos conseguido excelentes resultados”, acrescentou.
O engenheiro Lucio Cuenca, diretor do Observatório Latino-Americano de Conflitos Ambientais, disse ao Terramérica que a tecnologia desenvolvida por Ortiz aborda um segmento do processo de extração, mas não resolve todos os problemas ambientais gerados pela mineração. “O que faz é substituir algumas substâncias químicas como o ácido sulfúrico, mas não resolve, por exemplo, as altas quantidades de água utilizadas no processo de mineração”, advertiu.
Estima-se que a extração de cobre emprega mais de 12 mil litros de água por segundo, e organismos internacionais constatam uma queda considerável na disponibilidade de água superficial nesse país. A mineração é um setor fundamental da economia local. Em 2013, representou 11,1% do produto interno bruto, suas exportações totalizaram US$ 45,273 bilhões, enquanto gera quase um milhão de empregos diretos e indiretos. O Chile é o maior produtor e exportador de cobre do mundo, e também extrai molibdênio e, em menor medida, ouro, prata e ferro.
O certo é que as investigações de Ortiz e sua equipe continuam, agora no campo da dessalinização de águas marinhas, por meio de sistemas de biofiltros, uma alternativa animadora para a indústria da mineração. Em uma primeira etapa “estamos tratando água com altos níveis de cloreto que estão associados a outros elementos como íons, que também estão associados às águas salinas.
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A doutora em bioquímica Claudia Ortiz, coordenadora do projeto de fitotecnologia da Universidade de Santiago, que corrige os solos com plantas endêmicas. Foto: Cortesia da Universidade de Santiago
“Trabalhamos com espécies de plantas halófitas, isto é, que são muito tolerantes à alta salinidade e muito boas para capturar e chupar esses sais e armazená-los em seus tecidos”, explicou a bioquímica. “Estamos experimentando e tendo resultados muito bons para poder aplicar especificamente em lixiviados de lixões”, acrescentou.
Paralelamente, a equipe de pesquisadores desenvolve dois projetos patrocinados pela estatal Corporação de Fomento do Chile: um deles com matrizes de algas e outro com nanotecnologia, para eliminar os elementos particularmente salinos encontrados na água do mar ou águas com alta concentração de sais.
“A intenção é que essa tecnologia seja utilizada para o uso de água do mar nos processos de mineração. Determinamos que sob certas condições, nas quais a água do mar está diluída, poderíamos trabalhar com matrizes muito mais baratas do que as usadas hoje em dia para dessalinizar”, pontuou Ortiz. “Esses projetos ainda estão em desenvolvimento com resultados muito promissores e estarão finalizados no próximo ano. Portanto, estaremos em condições de fazer uma oferta tecnológica com outro tipo de matriz”, ressaltou. Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.

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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
(Terramérica)