Planta florescida de quinoa no Jardim Etnobotânico da União de Organizações Camponesas e Indígenas de Cotacachi, no Equador. Foto: Leisa Sánchez/IPS
Seguindo o boom da quinoa boliviana, o Equador incentiva este cultivo baseado na pesquisa e na agricultura sustentável.Quito, Equador, 22 de julho de 2013 (Terramérica).- Com a venda de barras de amaranto e pratinhos de quinoa, Lucinda Duy ganha a vida. Ela tem 24 anos e vive na província de Cañar, na região interandina do Equador, onde se tenta resgatar do esquecimento os grãos andinos. Duy participou de uma exibição gastronômica no IV Congresso Mundial da Quinoa e do Primeiro Simpósio de Grãos Andinos, realizados entre 8 e 12 deste mês em Ibarra, capital da província de Imbabura, 120 quilômetros ao norte de Quito.
“Deve-se incentivar mais a preparar diferentes pratos (com grãos andinos), porque estamos acostumados a fazer o mais fácil”, observou Duy ao Terramérica. A sopa de quinoa é o mais comum, mas ela também a utiliza em tortilhas, sorvetes e salada de frutas. O caso de Duy reflete um momento especial para a agricultura e a alimentação andinas. Este é o Ano Internacional da Quinoa, promovido pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Os grãos andinos de maior importância no Equador são o tremoço andino (
Lupinus mutabilis sweet), uma leguminosa plantada em quase seis mil hectares, e a quinoa (
Chenopodium quinoa), um pseudocereal que ocupa cerca de dois mil hectares, muito pouco se comparado com as extensões de arroz e milho, com quase 400 mil hectares cada um. No entanto, seria possível cultivar mais de 140 mil hectares de tremoço andino e quase 150 mil de quinoa, segundo o Manual Agrícola de Grãos Andinos. Outros dois grãos, o amaranto (
Amaranthus hypochondriacus) e o caruru (
Amaranthus quitensis) têm potencial semelhante.
A quinoa, de propriedades extraordinárias, terminou relegada da dieta cotidiana pela introdução de cultivos como trigo e cevada, entre outras razões. “Era considerada um alimento de índios, de pobres, de péssima aparência e gosto ruim”, e inclusive “erva daninha”, explicou ao Terramérica o chefe do Programa Nacional de Leguminosas e Grãos Andinos do Instituto Nacional Autônomo de Pesquisas Agropecuárias (Iniap), Eduardo Peralta. “Perdeu-se o costume de cultivá-la e consumi-la, e em muitas províncias desapareceu”, embora haja propriedades de agricultura familiar que mantêm parte da diversidade genética, e “a manejam e usam de acordo com seus costumes”, acrescentou.
Hoje se concentra na região interandina, nas províncias de Carchi, Imbabura, Pichinchia, Cotopaxi, Tungurahua, Bolívar e Chimborazo. O governo pretende estender o cultivo até dez mil hectares, até 2014, e incentiva sua incorporação na alimentação escolar. Além disso, foi criado este ano o Consórcio Equatoriano de Exportadores de Quinoa, com cinco empresas produtoras e comerciais que trabalham em cerca de 1.400 hectares. O consórcio concentra a oferta de produtos como barras energéticas, sopas, compotas, granola, farinha e biscoitos, tanto convencionais quanto com certificação orgânica.
Os preços da quinoa dispararam nos últimos anos, devido ao
boom de demanda de um segmento de consumidores de alimentos saudáveis nos Estados Unidos e na Europa. Uma saca de 60 quilos é cotada a US$ 140 no mercado internacional, enquanto a orgânica chega a US$ 160. Os preços internos são menores e variam entre US$ 60 e US$ 90 a saca. Os consumidores do mundo rico podem ter descoberto a quinoa há pouco tempo, mas o Iniap estuda, há três décadas, sua adaptação a diferentes ambientes agroecológicos da serra equatoriana, sua produtividade, resistência a doenças, precocidade e qualidade do grão.
Das 608 variedades ou populações de quinoa catalogadas até 2002 pelo Iniap, 283 são equatorianas e 325 procedem de outros países, principalmente Bolívia e Peru. As cultivadas hoje neste país são Iniap Tunkahuan e Iniap Pata de Veado. Prosperam em altitudes entre dois mil e 3,8 mil metros de altitude, em temperaturas que variam de sete a 17 graus e com pouca chuva.
Peralta esclareceu que, embora a quinoa “seja a estrela dos cultivos este ano, suas princesas são o amaranto, o tremoço andino e o caruru”. Estes últimos contribuem para equilibrar e preservar os solos por serem usados como cultivos de rotação. Uma lógica camponesa, explicou, que “não a inventamos, tendo sido inventada pelos agricultores, e isso é o melhor”, afirmou.
A plantação da variedade Iniap Tunkahuan é rotativa com cultivos de batata, ervilha, fava, lentilha, milho e feijão, o que torna mais sustentável o sistema e permite melhores colheitas, pontuou Peralta. Assim seria possível prevenir que o Equador enfrente os problemas da extensão de uma monocultura com grande demanda, como acontece hoje com a Bolívia.
Outro desafio é inovar e gerar valor agregado. Marcelo Silva, coordenador-geral de Redes Comerciais do Vice-Ministério de Desenvolvimento Rural, disse ao Terramérica que o Equador deve focar nichos de mercado de alto valor agregado, protegendo as agriculturas familiar e camponesa, sem esquecer a ciência, a pesquisa e o comércio justo. “Talvez nosso mercado não esteja na quantidade e no volume, mas na alta qualidade”, ressaltou. O aumento da área produtiva deve estar relacionado com os preços justos oferecidos aos produtores, ressaltou.
Salomón Salcedo, secretário técnico do Ano Internacional da Quinoa na FAO, afirmou ao Terramérica que este alimento deve ser um aliado na luta contra a fome, que afeta 870 milhões de pessoas no mundo, das quais 49 milhões vivem na América Latina e no Caribe. “Sem dúvida, os países andinos por sua tradição milenar terão um papel fundamental e é preciso considerar o potencial da cooperação Sul-Sul, entre institutos de pesquisa e governos. A FAO pode facilitar esses processos”, enfatizou. Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.LINKSBoom da quinoa desafia agricultura local
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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
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