Cultivo de alimentos biofortificados na horta municipal de Itaguaí. Foto: Cortesia Embrapa
O teor de vários nutrientes aumenta de forma acentuada em oito cultivos básicos desenvolvidos no Brasil.Rio de Janeiro, Brasil, 15 de julho de 2013 (Terramérica).- Em menos de dez anos os consumidores brasileiros terão à mão oito superalimentos desenvolvidos por cientistas do país. A iniciativa-piloto já é aplicada em 15 municípios. A biofortificação é uma melhora genética convencional que eleva as concentrações de micronutrientes em alimentos básicos mediante técnicas de laboratório e de campo. A ideia é simples: combater a deficiência de micronutrientes, que pode causar anemia, cegueira, problemas imunológicos e atraso no desenvolvimento.
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), dois bilhões de pessoas têm esta carência em todo o mundo. Há uma década, a estatal Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) iniciou esta linha de trabalho com o projeto BioFORT, como parte de uma aliança internacional para desenvolver variedades com grande conteúdo de micronutrientes. A Embrapa escolheu os alimentos preferidos nas mesas brasileiras: arroz, feijão, feijão de corda, mandioca, batata doce, milho, abóbora e trigo.
“Procuramos aumentar os teores de ferro, zinco e provitamina A. São os nutrientes que mais faltam, não apenas no Brasil, mas na América Latina e no mundo, causadores do que chamamos de fome oculta”, explicou ao Terramérica a engenheira de alimentos Marília Nutti, coordenadora do BioFORT. O ferro é fundamental. Metade da população infantil do Brasil apresenta algum grau de deficiência deste elemento, afirmou. O trabalho é feito com o cruzamento de plantas da mesma espécie, selecionando as sementes que apresentam melhores características de micronutrientes.
“Não é transgenia. Queremos uma dieta variada. A biofortificação ataca a raiz do problema e tem por objetivo as populações mais pobres. É cientificamente viável e também em termos de custos”, detalhou Marília. O programa tem apoio do HarvestPlus e do AgroSalud, consórcios de pesquisa que operam na América Latina, África e Ásia com recursos financeiros da Fundação Bill e Melinda Gates, do Banco Mundial e de outras agências internacionais de desenvolvimento.
No entanto, quanto mais nutritivos são estes novos alimentos? O feijão, por exemplo, passa de ter 50 miligramas de ferro por quilo para 90 miligramas por quilo. E a mandioca, quase desprovida de betacaroteno, passa a conter nove microgramas deste composto promotor da vitamina A para cada grama de alimento. Já na batata doce, os dez microgramas de betacaroteno por grama passam a ser 115. E o arroz experimenta aumento de 12 para 18 miligramas de zinco por quilo.
Em Itaguaí, município industrial 70 quilômetros ao sul do Rio de Janeiro, quase oito mil pré-escolares se beneficiam destes alimentos supernutritivos. Com cerca de 110 mil habitantes, Itaguaí tem produto interno bruto anual de US$ 14 mil por pessoa, e a maioria dos assalariados recebe o salário mínimo. Era o cenário ideal para a Embrapa iniciar o projeto, distribuindo os alimentos à rede de escolas públicas, que os utilizam na merenda escolar. Atualmente o município planta batata doce, abóbora, feijão e mandioca em um terreno de um hectare que também é usado para capacitar os agricultores familiares que abastecem as escolas.
“Itaguaí é um município modelo. É o terceiro ano consecutivo que ganhamos o prêmio para melhor gestão da merenda escolar. Temos projetos muito audaciosos para alcançar rapidamente toda a rede municipal de ensino em associação com todos os agricultores familiares”, disse ao Terramérica a secretária municipal de Meio Ambiente, Agricultura e Pesca, Ivana Neves Couto. Esta rede é formada por 62 escolas e 17 mil alunos. Em 2010, a prefeitura adotou os alimentos enriquecidos em micronutrientes em 13 unidades pré-escolares, com quase oito mil meninos e meninas.
A meta é incluir todos os agricultores familiares do município e, no prazo de dois anos, oferecer alimentos biofortificados a todas as escolas, além de mercados e feiras públicas da cidade. Um elemento a favor é a curiosidade infantil. “Quando dizemos que são alimentos com mais vitaminas, as crianças se animam ao verem as cores mais fortes, o que desperta seu interesse e incentiva o consumo”, contou Ivana.
O Brasil é o único país que trabalha com oito cultivos. Bangladesh, Colômbia, Índia, Moçambique, Nicarágua, Paquistão, Peru, República Democrática do Congo e Uganda investem cada um em um alimento. Segundo Marília, o desafio é que a biofortificação seja uma política nacional de segurança alimentar, tendo como exemplo o Panamá, que já a introduziu na agenda de governo.
A iniciativa brasileira está na fase-piloto de cultivo e presente em 11 Estados, nos quais cerca de 15 municípios empregam estes alimentos na merenda escolar. Embora tenha começado em Itaguaí, o olhar está voltado para Estados do Nordeste, como Maranhão, Piauí e Sergipe, que são os mais pobres. No total, há 67 unidades de cultivo e 1.860 agricultores familiares que trabalham diretamente nesta produção, segundo Marília. A escala é bastante reduzida para um país com 5.570 municípios e população próxima dos 200 milhões de habitantes.
As dietas pobres em ferro e zinco podem causar anemia, redução da capacidade de trabalho, problemas no sistema imunológico, atraso no desenvolvimento e até morte. A anemia é o maior problema nutricional do Brasil. Com investimento de quase US$ 10 milhões, este projeto reúne 15 universidades, além de centros de pesquisa e prefeituras. No ano que vem, a Embrapa pretende desenvolver um teste de impacto nutricional na população, para medir os resultados de seus alimentos em comparação com os convencionais. Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.LINKSBiofortificação para combater a “fome oculta”
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Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação apoiado pelo Banco Mundial Latin America and Caribbean, realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde. (IPS)
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