A China anunciou recentemente que pretende, a partir de 2016, limitar suas emissões de gases efeito estufa (GEEs). O gesto deve gerar uma reviravolta na ordem mundial das mudanças climáticas e abalar outras nações, entre as quais o Brasil, que até agora usavam o gigante asiático como razão de não assumirem metas obrigatórias.
Apesar da presidente Dilma Rousseff, em discurso, por exemplo, afirmar firmeza na luta contra o aquecimento global, há uma forte resistência da sociedade brasileira em relação ao estabelecimento de metas obrigatórias. A vantagem econômica que a China teria, caso o Brasil saísse à frente na questão das metas, era o principal argumento do governo de não aceitar esses compromissos. Outros países também se utilizavam desse pensamento.
A última ocasião em que ocorreu uma tentativa de acordo entre os países desenvolvidos e os emergentes sobre o tema ocorreu em 2009, durante a Conferência das Nações Unidas em Copenhague. No evento, o Brasil assumiu uma meta voluntária de reduzir entre 36% e 39% as emissões de GEE até 2020.
Desde então, houve reduções das emissões brasileiras, entretanto, elas ficaram restritas ao setor de florestas. Em julho, inclusive, as autoridades nacionais alardearam que as emissões brasileiras de gases de efeito estufa caíram 38,7% entre 2005 e 2010 e, com isso, o País teria cumprido 65% da sua meta de redução voluntária de GEE até 2020. Esse resultado só foi alcançado graças à queda de 76% no desmatamento da Amazônia. As emissões cresceram 21,4% no setor de energia, 5,3% nos processos industriais, 5,2% na agropecuária, e 16,4% nos resíduos sólidos. Isso coloca o Brasil entre os maiores emissores do mundo.
À frente do Brasil e atual maior poluidora do planeta, a China liberou, em 2012, 9,7 bilhões de toneladas de GEEs para a atmosfera, alcançando quase 25% do total das emissões mundiais. Sua proposta de limitar as emissões, anunciada no final de maio, ainda precisa ser aprovada por Pequim, mas tem grandes chances de aprovação, pois conta com o apoio do presidente Xi Jinping. Além disso, o governo prometeu investir 100 bilhões de yuan (o equivalente a R$ 30 bilhões) nos próximos três anos para diminuir a poluição.
Para reduzir suas emissões, uma das ações da China foi criar um mercado interno de negociação de carbono. A experiência começou na cidade de Shenzhen, na província de Guangdong, a primeira das sete áreas incluídas no projeto piloto de comércio de emissões, e uma das zonas econômicas especiais do país. Numa primeira etapa, o programa da cidade de Shenzhen incluirá 635 empresas. Até agora, a Bolsa de Emissões de Shenzhen já negociou 21.112 toneladas de carbono, num total de oito operações. A meta do projeto é reduzir, até 2020, a quantidade de dióxido de carbono emitida por unidade de produto interno bruto em 40% a 45% dos níveis de 2005.
A experiência chinesa com os novos mercados de carbono deve afetar todo o mundo. Espera-se que eles aceitem de 10% a 15% de utilização de offsets para cumprimento de sua meta, e que esses offsets possam vir de projetos de MDL chineses, que hoje correspondem a mais da metade dos projetos de MDL registrados junto à Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC, na sigla em inglês).
As primeiras licenças chinesas de CO2 equivalente foram negociadas a preços entre 28 e 30 yuans (em torno de US$ 4,80) por tonelada métrica, cerca de 22% menos do que o preço das licenças europeias, que hoje custam o equivalente a US$ 6,65 na bolsa ICE Futures de Londres, a maior do mundo no mercado de carbono em volume negociado.
Mesmo em fase inicial a China caminha para mudar seu posicionamento quanto às mudanças climáticas. É urgente que seu programa dê certo, mas seu exemplo já foi dado. Que outras nações mudem posturas e passem a aceitar discutir metas de redução de emissão.
* Marco Antonio Fujihara é diretor da Keyassociados e consultor do Banco Mundial. (O Autor)
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