Universo Energético
Despoluição da Baía de Guanabara começou na década de 90, mas não teve eficácia; Oceanógrafo propõe ações de curto prazo
Barqueata na Baía de Guanabara convoca população a defender despoluição. Foto de Tomaz Silva/Agência Brasil
As tentativas de despoluição da Baía de Guanabara tiveram início muito antes de o Rio de Janeiro ser cotado para sediar as Olimpíadas de 2016. O Programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG) foi assinado em julho de 1991 e previa a cooperação técnica entre os governos brasileiro e japonês, depois da experiência bem-sucedida na despoluição da Baía de Tóquio. Além do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), houve investimento do Japan Bank for Internacional Cooperation (JBIC).
Em 15 anos de vigência, foram consumidos US$ 800 milhões, do total de US$ 1,169 bilhão previstos, mas o programa teve pouca efetividade. A última parcela que seria repassada pelo BID foi cancelada devido aos atrasos no cronograma e à falta da contrapartida do governo do estado. Os dados fazem parte da Auditoria Operacional no PDBG feita pelo Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ) em agosto de 2006.
O PDBG vigorou de 1991 a 2006 e envolveu um amplo conjunto de obras e atividades multidisciplinares para reduzir os índices de poluição da Baía de Guanabara, com a missão de implantar sistemas, fazer obras e aperfeiçoamento humano dos órgãos operadores.
Para o professor de recursos hídricos Paulo Canedo, do Instituto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ), o intuito do PDBG era sanear a parte continental da baía, para que a poluição não chegasse na água. Mas, de acordo com ele, as obras feitas não beneficiaram quem mais precisava.
“O investimento foi feito, obras foram realizadas, o dinheiro não sumiu. Mas o dinheiro não se transformou em benefício para quem precisava. Estações de tratamento de esgoto foram construídas mas não estão funcionando adequadamente, não tem esgoto o suficiente chegando, portanto, não estão cumprindo a sua missão.”
O PDBG construiu quatro grandes estações de Tratamento de Esgoto (ETEs): Alegria, no Caju, zona portuária do Rio de Janeiro; São Gonçalo, na região metropolitana da capital; e Pavuna e Sarapuí, na Baixada Fluminense. Entretanto, as redes coletoras que deveriam levar o esgoto das residências até as ETEs não foram construídas deixando as estações de tratamento sem utilidade.
A conclusão do Tribunal de Contas é que, em 12 anos de execução do Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, houve falhas graves no planejamento e controle. Com 80,45% do valor total de investimento empregado, as ETEs funcionavam na época da análise muito abaixo da capacidade. O relatório aponta também atrasos excessivos nas obras devido a falhas de concepção dos projetos, além de falhas de planejamento, pendências dos municípios envolvidos, atrasos pela não liberação de recursos estaduais e falta de acompanhamento da dinâmica socioeconômica da região.
“Os constantes atrasos no pagamento de despesas para a execução de obras demostram a deficiência na administração financeira por parte do governo do estado, retardando e/ou paralisando obras de elevada relevância ambiental e social, além de causarem prejuízo ao Erário estadual”, aponta o relatório.
A auditoria demonstrou que os atrasos no cronograma levaram o governo do estado a pagar juros de US$ 259,88 milhões ao BID, além de US$ 7,2 milhões para a Comissão de Crédito por não utilizar todo o recurso no prazo estabelecido.
Para o secretário executivo do Comitê de Bacia da Baía de Guanabara, Alexandre Braga, o que faltou na época do PDBG foi trabalho integrado. “Nós estamos com metas de 18 anos atrás que nós não alcançamos. Foi por falta de interesse do secretário? De jeito nenhum. Foi por falta de interesse do governo? Não. Foi por falta de interesse da sociedade? Não. O que falta é uma articulação. Nós precisamos todos trabalhar juntos para alcançar esse objetivo.”
Oceanógrafo propõe ações de curto prazo para melhorar águas da Baía de Guanabara
O oceanógrafo David Zee, que acompanha desde 1994 o Programa de Despoluição da Baía de Guanabara, propôs ontem (10) uma solução de curto prazo para melhorar as condições das águas da baía até as Olimpíadas de 2016. Ele foi um dos especialistas que participaram nesta segunda-feira da audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) para discutir o assunto.
Segundo ele, é preciso a concentração de esforços e dinheiro na finalização de unidades de Tratamento de Rios (UTRs) nos afluentes mais poluídos. “Já temos oito UTRs planejadas e algumas já estão até prontas, só falta iniciar a operação. E dá para construir em cinco meses. Essas pequenas estações são exequíveis, podem ser implementadas até Olimpíadas”, afirmou, admitindo que a solução é paliativa.
A vice-presidente da Comissão de Saneamento da Alerj, deputada Lucinha, afirmou que a solução para despoluir a Baía de Guanabara tem que passar pela implementação de um sistema de saneamento dos municípios da Baixada Fluminense, região cortadas por rios que integram a bacia hidrográfica da baía. “São 7 milhões e meio de pessoas em 15 municípios. Apenas 15% do esgoto são tratados, e esse lixo é jogado nos afluentes que desembocam na baía”.
Para a deputada, o dever de casa depende dos municípios em parceria com o governo federal no tratamento dos esgotos. Ela citou ainda a questão dos lixões como mais um fator de poluição. “Outro problema sério, é a falta de tratamento dos resíduos sólidos devido aos diversos lixões que ainda existem na Baixada”. Lucinha defendeu um termo de compromisso com cada um dos municípios para que tenham um centro de tratamento de resíduos.
Ao todo, 55 afluentes da Baía de Guanabara passam por 15 municípios. O coordenador das atividades do mamíferos aquáticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), José Lailson Brito, disse que das 60 tartarugas marinhas monitoradas pela Faculdade de Oceanografia da, 100% tinham pedaços de plástico na via digestória e afirmou que a falta de esperança dos moradores do entorno baía em relação à despoluição de suas águas.
“Fazemos trabalhos com comunidades e as pessoas estão descrentes. Vemos crianças de 5 anos e 6 anos que não acreditam que a limpeza da baía tem jeito. Esse é o pior legado”, comentou. “Temos que reverter essa situação, as pessoas têm que acreditar que é possível”. Lailson ao defendeu um observatório que reúna diferentes atores envolvidos no processo de limpeza da Baía de Guanabara.
Guido Gelli, técnico da Secretaria de Estado do Ambiente (SEA), cobrou mais transparência nas informações sobre as ações de cada município e empresas contratadas sobre a coleta de lixo na região. “As informações chegam truncadas para a população como um todo. Por exemplo, é muito difícil hoje saber se os municípios estão coletando o lixo e dando destino final adequado”. Para ele, é importante que exista um painel atualizado sobre o que está sendo feito.
O fundador do Movimento Baía Viva, biólogo Sérgio Ricardo, também falou sobre a importância da transparência dos órgãos públicos, inclusive a das ações de fiscalização da SEA, como das auditorias ambientais das empresas e o monitoramento da água e do ar. “A secretaria deve à população a publicidade dessas informações, que são essenciais para sabermos quais são os poluentes e as concentrações”, disse.
Desde a década de 1990, a Baía de Guanabara recebe programas de despoluição descontínuos, que sofrem com a falta de investimentos.
Por Akemi Nitahara e Flávia Villela, da Agência Brasil, in EcoDebate, 11/08/2015
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