desmond640 Contaminadores climáticos no banco dos réus internacional
Operários limpam uma estrada bloqueada por um deslizamento de terra em Trinidad. As indenizações por perdas e danos devido à mudança climática se tornaram uma importante demanda dos países em desenvolvimento. Foto: Desmond Brown/IPS

Bridgetown, Barbados – Podem os governos do Caribe tomar medidas legais contra outros países que colaboram para o aquecimento global com consequências devastadoras para a região? A resposta é sim, segundo o ex-diplomata regional Ronald Sanders, que também é pesquisador na Universidade de Londres. Ele considera que uma demanda legal é possível, desde que os pequenos Estados insulares em desenvolvimento atuem em conjunto.
Sanders acredita que o Tribunal Internacional de Justiça, com sede em Haia, estará disposto a ouvir seus argumentos, mas um obstáculo importante será o requisito dessa corte para que todas as partes envolvidas em uma disputa concordem com sua jurisdição.
“É muito improvável que os países que estão esquentando o planeta – que agora incluem Índia e China, além de Estados Unidos, Canadá e União Europeia – concordem com a jurisdição”, opinou Sanders à IPS. “A alternativa, se os países querem pressionar sobre o assunto da compensação pela destruição causada pela mudança climática, é que se apresentem na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas” (ONU), acrescentou.
O ex-diplomata pontuou que os países que integram a Comunidade do Caribe (Caricom) podem, “como grupo, apresentar uma resolução na qual exponham que acreditam, e que há evidência para apoiar seu argumento, que a mudança climática e o aquecimento global estão tendo um efeito material sobre a integridade de seus países”. “Vemos desaparecerem áreas costeiras e sabemos que, se continuar aumentando o nível do mar, grandes partes das ilhas atuais desaparecerão, e algumas delas inclusive poderão ficar submersas. Dessa forma, ali está a evidência”, acrescentou.
Sanders recordou os efeitos prejudiciais das inundações e os deslizamentos de terra em São Vicente e Granadinas, Santa Lúcia e Dominica em dezembro de 2013. O primeiro-ministro de São Vicente e Granadinas, Ralph Gonsalvez, considera esses fenômenos “sem precedentes” e destacou que apenas em seu país as perdas causadas foram de US$ 60 milhões, segundo estimativas preliminares.
“Os habitantes do Caribe sabem, a partir de sua própria experiência, que a mudança climática é real”, afirmou Sanders. “Sabem de dias e noites mais quentes do que antes, de furacões mais frequentes e intensos, embora haja anos, como o último, sem nenhum, ou de prolongadas secas seguidas por fortes chuvas e inundações fora de sua estação, e da reconhecível erosão de áreas costeiras e arrecifes”, acrescentou.
Na 19ª Conferência das Partes (COP 19) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, realizada em novembro, em Varsóvia, os países em desenvolvimento lutaram arduamente pela criação de um terceiro pilar de um novo tratado climático em 2015. Após duas semanas e 36 horas de negociações, finalmente conseguiram a aprovação do Mecanismo Internacional de Perdas e Danos, que se somará aos pilares de adaptação e mitigação dos efeitos da mudança climática.
Os detalhes desse mecanismo serão acordados nas negociações climáticas de junho próximo em Bonn, e na decisiva, em Paris, em 2015. Como presidente da Aliança de Pequenos Estados Insulares, a nação micronésia de Nauru participará, na segunda semana de abril, de uma reunião em Nova Délhi do grupo Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China) para tentar criar uma plataforma comum para as negociações internacionais.
“Naturalmente, não é só o Caribe”, ressaltou Sanders à IPS. “Atualmente, vários outros países do mundo, por exemplo, os do Oceano Pacífico, enfrentam um perigo ainda maior do que nós. Há países na África e na Ásia que enfrentam esse problema. Se todos eles unirem esforços, haverá uma questão moral a ser apresentada na ONU, e talvez esse seja o lugar no qual pressionaremos mais eficazmente se agirmos juntos. Isso exigirá uma grande liderança, grande valentia e grande unidade” destacou.
Sanders deu como exemplo os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE), que atuam em grupo, se consultam entre si e apresentam um programa para que seja assumido como o padrão internacional, e que os países em desenvolvimento devem aceitar.
A primeira-ministra da Jamaica, Portia Simpson Miller, elogiou que na cúpula da Caricom, realizada em março em São Vicente, os governantes do bloco tenham decidido dar prioridade ao tema climático, depois de, ao terminar 2013, as chuvas terem devastado Santa Lúcia, Dominica e São Vicente e Granadinas.
Nesse encontro, os chefes de governo acordaram a criação de um grupo de trabalho sobre mudança climática e pequenos Estados insulares em desenvolvimento, para dar orientação aos negociadores caribenhos sobre este fenômeno, bem como aos seus ministros e líderes políticos, para garantir o posicionamento estratégico da região nas negociações.
Em Antiga, onde a seca persistiu durante meses, as bacias secam rapidamente. O gerente de assuntos hídricos da estatal Autoridade de Serviços Públicos de Antiga, Ivan Rodrigues, culpou a mudança climática. “Sabemos que o clima está mudando e o que temos de fazer é enfrentá-lo”, disse à IPS.
Mas Rodrigues não se convence da ideia de uma ação legal internacional contra os grandes países industrializados. “Penso que o que causará uma reversão das práticas é o ativismo dos consumidores. O argumento pode não ser suficientemente forte para um tribunal legal realmente castigar um governo”, afirmou.
No entanto, Sanders acredita firmemente que uma opinião do Tribunal Internacional de Justiça marcará uma enorme diferença. “Se a Assembleia Geral da ONU aceitar uma resolução quanto a querermos uma opinião do Tribunal sobre este assunto, penso que poderíamos obter uma opinião favorável aos países caribenhos e outros afetados pela mudança climática”, ponderou à IPS.
“Se for apresentada uma demanda pela qual países, governos e grandes empresas saibam que se continuarem com essas práticas danosas serão tomadas medidas contra eles, naturalmente mudariam sua posição, porque no final das contas querem ser rentáveis e ter êxito. Não querem ter de manter lutas judiciais e perdê-las e depois precisar pagar indenizações”, enfatizou Sanders. Envolverde/IPS
(IPS)