Roma, Itália,3/2015 – Está claro que não será atingida a meta de controlar a mudança climática. É preciso recordar, antes de tudo, que o objetivo de o aquecimento global não passar de dois graus centígrados antes de 2020 foi adotado em 2009 como fórmula de consenso pela 15ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, realizada em Copenhague.
Na comunidade científica muitos reclamam medidas imediatas, mas em favor do realismo político aceitou-se um objetivo pouco ambicioso. Resumindo, o acordo era deter o aumento do aquecimento global antes de 2020 e a partir desse ano dar início a um processo destinado a reverter gradualmente a mudança climática até níveis seguros, para ser concluído antes de 2050.
Entretanto, nos últimos quatro anos já foi registrado aumento de um grau na temperatura, e resta apenas outro grau até 2020. A Agência Europeia de Meio Ambiente, que publica um informe a cada cinco anos, alerta que a Europa precisa de “metas muito mais ambiciosas” para poder alcançar os objetivos declarados.
A União Europeia programou a redução de suas emissões de gases-estufa entre 80% e 90% antes de 2050. Em lugar de uma redução, a Alemanha registrou aumento de 20 milhões de toneladas de emissões de carbono entre 2012 e 2013. Para alcançar a meta, a Alemanha deveria reduzir anualmente as emissões em 3,5% nos próximos seis anos, um objetivo difícil, que aumentará os custos da energia e provocará reações no sentido de bloquear as medidas que possam ser prejudiciais à economia.
Precisamente, essa posição é a mesma do opositor Partido Republicano nos Estados Unidos: rechaçar toda proposta para preservar o ambiente.
Atualmente, os efeitos da mudança climática são evidentes, não só para os especialistas em clima. No ano passado, as pessoas deslocadas em razão de desastres climáticos, como furacões, deslizamentos, secas, inundações e incêndios florestais, chegaram ao alarmante número de 11 milhões.
O Centro de Pesquisa sobre a Epidemiologia de Desastres, que registra desastres naturais há 110 anos, publicou um informe conjunto com o Instituto de Energia e Recursos, que comprova um aumento exponencial de aproximadamente 50 desastres naturais em 1975 para 525 em 2002.
Em 2011, o custo dos desastres naturais subiu às nuvens, chegando a US$ 350 bilhões. E entre 1900 e 2009, os desastres hidrometeorológicos aumentaram de 25 para 3.526. Segundo o informe, em conjunto, esses fenômenos e as situações geológicas e biológicas extremas aumentaram de 72 para 11.571 no mesmo período.
Não há dúvidas de como a atividade humana tem um impacto dramático no clima e, em geral, no planeta, o que afeta a vida das pessoas. As universidades de Chicago, Yale e Harvard calculam que na Índia os que vivem em áreas contaminadas perdem, em média, 3,2 anos de expectativa de vida.
E, como sempre, o mundo avança por dois caminhos, desvinculados e opostos.
O principal debate é sobre a quantia a ser investida na mudança climática. A solicitação original foi de US$ 15 bilhões, mas os países industrializados a reduziram para US$ 10 bilhões, distribuídos ao longo de alguns anos entre os países em desenvolvimento que não têm que realizar investimentos. Até agora foram reunidos US$ 7,5 bilhões.
Na conferência de Copenhague os países ricos disseram que o investimento no Fundo Verde para o Clima chegará aos US$ 100 bilhões em 2020. As contribuições registravam apenas US$ 110 milhões em 2013.
Esse é o caminho para a redução das emissões fósseis. Vejamos o que os países ricos estão gastando nesse item.
O informe do britânico Instituto para o Desenvolvimento mostra que os governos do Grupo dos 20 (G-20) países industrializados e emergentes também está financiando com US$ 88 bilhões anuais a exploração de combustíveis fósseis, mediante fundos públicos, subsídios nacionais e investimentos das empresas estatais.
Os governos do G-20 gastam mais do que o dobro do que gastam as 20 maiores empresas privadas para encontrar novas reservas de petróleo, gás e carvão. Isso demonstra que, sem os investimentos públicos, o setor privado não poderia expandir a produção de combustíveis fósseis.
A Agência Internacional de Energia estima que os governos do G-20 deveriam reorientar US$ 49 bilhões anuais – pouco mais da metade do que gastam para apoiar a exploração de combustíveis fósseis – para impulsionar o acesso universal à energia, substituindo o sistema atual, baseado em fontes de energia não renovável.
Como de costume, o sistema espalha declarações atraentes, mas às vezes faz o contrário.
O novo é que a campanha contra a mudança climática está perdendo força e credibilidade. É um fato que, nos Estados Unidos, os republicanos são financiados pelas grandes corporações de energia, que farão todo o possível para boicotar qualquer acordo que o presidente Barack Obama possa conseguir na definitiva Conferência das Partes sobre a Mudança Climática, em dezembro deste ano em Paris.
Até agora só alguns cientistas discordam das conclusões do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre a Mudança Climática, integrado por 2.200 especialistas, sobre a relação entre as atividades humanas e a deterioração climática. As posturas negativas dos poucos cientistas dissidentes obtêm eco desproporcional nos meios conservadores.
Mas agora se revela que um dos principais dissidentes, Willie Soon, é financiado pela indústria dos combustíveis fósseis. Na última década, Soon recebeu pelo menos US$ 409 mil da empresa norte-americana Southern Company Service, uma das maiores companhias de serviços públicos, com grandes investimentos em centrais elétricas alimentadas a carvão.
Os multimilionários norte-americanos Charles e David Koch, patrocinadores de organizações de extrema direita e que doarão ao partido Republicano US$ 980 milhões para as próximas eleições presidenciais, proporcionaram a Soon pelo menos US$ 230 mil por meio da Fundação Beneficente Charles G. Koch.
O que está em jogo é nada menos do que a vida de nosso planeta. Mas o sistema governamental não está agindo com a urgência necessária. Para alcançar os objetivos indicados pela comunidade científica faltam investimento muito maiores do que os atualmente disponíveis.
Esconder a cabeça, como o avestruz, não serve para evitar o desastre que se avizinha. Envolverde/IPS
* Roberto Savio é fundador da agência de notícias IPS e editor do boletim Other News.
(IPS)