Proteção das áreas marinhas como garantia da sustentabilidade. Entrevista com Ronaldo Francini Filho
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Proteção das áreas marinhas como garantia da sustentabilidade. Entrevista com Ronaldo Francini Filho


“Infelizmente algumas áreas protegidas contra a pesca sofrem de outro problema: a qualidade da água, que está declinando muito rapidamente na costa brasileira”, lamenta o biólogo.


Confira a entrevista :


“Estamos vivendo um momento em que nunca foi tão difícil criar uma unidade de conservação, principalmente marinha. Infelizmente a conservação do meio ambiente tem sido vista como um entrave ao desenvolvimento”. A constatação é de Ronaldo Francini Filho, que se dedica ao estudo da preservação das áreas marinhas e apoia a criação de uma legislação para preservar tais regiões. Segundo ele, menos de “5% das áreas marinhas brasileiras são protegidas, e algumas delas são consideradas protegidas apenas no nome, como as Áreas de Proteção Ambiental – APAs estaduais, que foram criadas na década de 1980 para permitir o licenciamento estadual e não mais federal e, para que com isso, os governos estaduais pudessem barganhar com as empresas que gostariam de explorar a área costeira dos estados”.



Na entrevista a seguir, concedida por telefone, o biólogo informa que a “maior parte das APAs estaduais não apresenta plano de manejo, e nenhum tipo de fiscalização. Também existem as áreas integralmente protegidas, onde a pesca e qualquer tipo de atividade extrativista é proibida, mas essas correspondem a menos de 1% na costa brasileira”. Para ele, as atividades comerciais em larga escala e o implemento dos portos no país “são os principais responsáveis pela oposição, inclusive dentro do governo, para a criação de áreas protegidas no Brasil e para a manutenção das áreas protegidas hoje”.



Ronaldo Francini Filho (foto abaixo) é graduado em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo, mestre e doutor em Ciências (Zoologia) pela mesma universidade. É professor efetivo do curso de graduação em Ecologia da Universidade Federal da Paraíba – UFPB.



Confira a entrevista.



IHU On-Line – Em que consiste a proposta da Lei Mar? Como vê a iniciativa de criar uma legislação para preservar as áreas marinhas brasileiras?



Ronaldo Francini Filho – Existem legislações para a preservação de alguns ecossistemas brasileiros, como a Mata Atlântica. Nesse sentido, a Lei Mar tem os mesmos moldes das demais leis que foram criadas para preservar outros ecossistemas. Essa lei ainda está sendo discutida por diversos atores que têm interesse no ecossistema marinho, mas a intensão é de que ela seja criada o quanto antes, uma vez que se percebe um avanço da degradação deste ecossistema.



IHU On-Line – Qual a importância dos oceanos para os serviços ambientais?



Ronaldo Francini Filho – Os oceanos oferecem uma série de serviços que são utilidades para a vida humana, tais como processos que geram o ar que respiramos, os peixes que comemos, os fármacos consumidos, que são produzidos a partir de uma série de organismos marinhos como esponjas e corais. Há ainda um universo microbiológico dentro dos organismos marinhos, os quais estão sendo pesquisados para se saber quais são os benefícios em relação a uma série de doenças. Por enquanto estamos perdendo essa biodiversidade e esse potencial farmacológico de compostos bioativos.



IHU On-Line – Pode explicar o que é a Amazônia Azul?



Ronaldo Francini Filho – Amazônia Azul é um termo cunhado pela Marinha do Brasil de forma estratégica para chamar atenção ao tamanho do ecossistema marinho, que se estende ao longo de oito mil quilômetros da costa brasileira. Então, trata-se de uma zona econômica enorme, que é ainda maior que a Amazônia Verde. O termo foi cunhado como uma forma de chamar atenção para esse ecossistema, apesar das críticas recebidas. De todo modo, ele serve para que se preste mais atenção nesse grande ecossistema, o qual fornece serviços que fazem com que se tenha sustentabilidade no longo prazo.



IHU On-Line – Que percentual das áreas marinhas é protegido no país? Quais são as áreas marinhas protegidas atualmente e quais precisam de proteção?



Ronaldo Francini Filho – Menos de 5% das áreas marinhas brasileiras são protegidas, e algumas delas são consideradas protegidas apenas no nome, como as Áreas de Proteção Ambiental – APAs estaduais, que foram criadas na década de 1980 para permitir o licenciamento estadual e não mais federal e, para que com isso, os governos estaduais pudessem barganhar com as empresas que gostariam de explorar a área costeira dos estados.



Então, a maior parte das APAs estaduais não apresenta plano de manejo e nenhum tipo de fiscalização. Também existem as áreas integralmente protegidas, onde a pesca e qualquer tipo de atividade extrativista é proibida, mas essas correspondem a menos de 1% na costa brasileira. Precisamos lembrar que o Brasil foi o primeiro signatário da Convenção da Biodiversidade, comprometendo-se em criar, até 2012, 20% de áreas protegidas. O país está muito aquém, enquanto outros cumpriram suas metas.



IHU On-Line – Por que o percentual de áreas protegidas ainda é muito pequeno? Desde quando a preservação é um tema que aparece na política ambiental do Estado brasileiro? Como o Brasil se posiciona diante das discussões acerca da preservação dos oceanos?



Ronaldo Francini Filho – Em alguns países foram criadas áreas protegidas como na Austrália. Esse processo envolve a comunicação entre todos os atores envolvidos nas áreas protegidas, incluindo os setores turístico, de pescador, científico, da Marinha e de empresas interessadas no ramo. Esse é um processo relativamente lento. A criação desses espaços precisa de articulação e vontade política.



Estamos vivendo um momento em que nunca foi tão difícil criar uma unidade de conservação, principalmente marinha. Infelizmente a conservação do meio ambiente tem sido vista como um entrave ao desenvolvimento. Precisamos mudar esse paradigma. A sociedade necessita se organizar, e a questão da preservação das áreas marinhas é importante porque milhares de pessoas dependem da preservação dessas áreas. As áreas protegidas são incluídas como áreas de manejo, porque já sabemos que com a proteção acabamos incrementando os estoques pesqueiros nas adjacências das áreas não protegidas. Então, quando se protege uma região, há um incremento na pesca, ao contrário do que se pensa.



IHU On-Line – O que gera mais impacto ambiental nas áreas marinhas brasileiras?



Ronaldo Francini Filho – A pesca é ilegal, sem dúvida. Falta fiscalização em áreas muito importantes, como os parques nacionais de Abrolhos e Fernando de Noronha. Infelizmente algumas áreas protegidas contra a pesca sofrem de outro problema: a qualidade da água, que está declinando muito rapidamente na costa brasileira. Isso faz com que ocorram eventos de mortalidade em massa de corais e outros organismos importantes para o ecossistema como um todo. Com isso a atividade pesqueira começa a cair. Então, precisamos nos preocupar tanto com a questão da pesca quanto com a qualidade da água.



IHU On-Line – A exploração de petróleo ainda causa muito impacto nos oceanos?



Ronaldo Francini Filho – Sim, sem dúvida. A atividades comerciais em larga escala, que geralmente favorecem uma pequena parcela da população, a exploração de petróleo, a exploração mineral de calcário e o implemento dos portos no Brasil são os principais responsáveis pela oposição, inclusive dentro do governo, para a criação de áreas protegidas no Brasil e para a manutenção das áreas protegidas hoje. Existem propostas da Agência Nacional de Petróleo – ANP para a criação de blocos de petróleo adjacentes ao Parque Nacional Marinho de Abrolhos. Então, realmente são coisas que não levam em consideração a sustentabilidade e a conservação marinha. Precisamos encontrar um meio-termo entre o crescimento econômico, o desenvolvimento, e a conservação do meio ambiente ou, do contrário, o Brasil irá acabar como a China.



IHU On-Line – Como vê a proposta de uma governança global dos oceanos?



Ronaldo Francini Filho – A governança global faz parte de uma das estratégias para tentar vincular a conservação em escala global, uma vez que, muitas vezes, a conservação não pode ser só em escala local. Temos os problemas relacionados às espécies migradoras, como tartarugas, tubarões. Então, há um estoque que é conservado em um país e que vai ser repescado em outro. É preciso elaborar acordos globais para conseguir manejar esses recursos e conservá-los em escala global. Claro que as medidas mais efetivas nas últimas décadas têm sido implementadas em escalas locais, as quais estão, de alguma maneira, inseridas dentro desse contexto global.

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FONTE :
(Ecodebate, 09/05/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]







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