Bloqueada pelo STF desde o fim do ano passado, lista que denuncia empregadores de trabalho escravo pode voltar a ser divulgada com Portaria Interministerial
Em reunião extraordinária da Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (CONATRAE), o ministro do Trabalho e Emprego, Manoel Dias, e a ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), Ideli Salvatti, assinaram uma Portaria Interministerial que facilitará o processo de divulgação da “Lista Suja” de trabalho análogo ao escravo.
A lista oficial do MTE, amplamente usada pelo mercado para evitar fornecedores envolvidos com o trabalho escravo, está fora do ar desde dezembro do ano passado, por decisão liminar do ministro Ricardo Lewandowski, do STF, que bloqueou a portaria que normatizava o documento.
A nova portaria, assinada nesta terça-feira (30), traz aperfeiçoamentos ao antigo texto, como esclareceu o ministro Manoel Dias. “Essa Portaria agiliza o processo para acabar com o trabalho escravo. Não estamos alterando o conteúdo, apenas agilizando o encaminhamento”. Segundo ele, a nova Portaria sana as questões impostas pelo STF, como o direito a ampla defesa dos citados.
O novo documento é ancorado na Lei de Acesso a Informação (LAI), para que a sociedade saiba os nomes dos empregadores cujos processos sobre trabalho escravo tenham transitado administrativamente em primeira e segunda instâncias. Foi com base nesta lei que o ONG Repórter Brasil e o Blog do Sakamoto obtiveram e publicaram uma lista paralela, no início de março, com dados fornecidos pelo MTE. Esta listagem vinha sendo, até o momento, a única alternativa atualizada para consulta de empresas e da sociedade.
Para a ministra Ideli Salvatti, a nova portaria traz um texto aperfeiçoado: “assim, não restará dúvidas a respeito da legalidade dessa Portaria, assim como da divulgação da lista”. Com isso, “voltaremos à normalidade desse instrumento [mecanismo de divulgação] tão importante no combate ao trabalho escravo”, pontuou Salvatti.
Antes atualizada a cada seis meses, a última “Lista Suja” oficial divulgada data de julho do ano passado. Com a nova Portaria Interministerial, a lista será atualizada cada vez que um novo nome for legalmente reconhecido como promovedor do trabalho em condições análogas à escravidão.
“Para o Greenpeace, a indicação de retomada da Lista Suja é positiva. O cadastro é um documento concreto, que permite o cumprimento de um dos critérios fundamentais de compromissos de mercado assumidos pelas maiores empresas do país na busca pelo Desmatamento Zero. A escravidão é inaceitável”, afirma Adriana Charoux, da campanha Amazônia do Greenpeace. “Agora é ficar de olho para ver a nova lista publicada”, completa.
“Um país como o nosso, que teve mais de três séculos de escravidão e décadas de ditadura não pode admitir nem a escravidão e nem a ditadura”, diz Ideli Salvati.
Entenda o caso
A Lista Suja do Trabalho Escravo existe desde 2003. Criada pelo MTE e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), o cadastro é considerado um marco no combate ao trabalho escravo, pois dá transparência e acesso a informação sobre o tema.
O documento utilizado por compradores e instituições financeiras como ferramenta para eliminar o trabalho escravo de seus negócios, era atualizado semestralmente. Mas uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin 5209) movida pela Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), resultou em decisão liminar emitida pelo ministro Ricardo Lewandowski, em pleno o recesso de Natal, bloqueando a nova publicação até que a Adin 5209 tenha sido julgada.
Atualmente, mais de 400 companhias de diversos setores utilizam a ferramenta para cumprir o Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo. O material podia ser acessado por qualquer cidadão. Sem isso, não há garantias de que determinado produto não faça parte desta cadeia nefasta.
Da mesma maneira, as empresas que assinaram o Compromisso Público da Pecuária e a Moratória da Soja, que inclui as maiores empresas de soja e carne do mundo, utilizam o cadastro do MTE diariamente antes de aprovar as compras junto aos seus fornecedores, para manter este ilícito social longe de suas cadeias produtivas.
Na Amazônia, o trabalho escravo está intimamente relacionado com atividades que promovem a destruição da floresta, como a extração ilegal de madeira e a Pecuária. O governo brasileiro precisa mostrar para a sociedade que está comprometido em acabar com estes problemas. Reforçando os mecanismos de proteção já existentes, como a “Lista Suja”, e criando novos, como uma Lei pelo Desmatamento Zero no Brasil.
* Publicado originalmente no site Greenpeace Brasil.
(Greenpeace Brasil)