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No caso brasileiro, a estrada do Colono é estreita, e não tem horizonte, só se vê uma paisagem monótona de arvores. Se você anda um quilômetro ou sete, é a mesma coisa, ou seja, não se encaixa no conceito de estrada-parque”, informa o biólogo.O projeto de lei do deputado Assis de Couto (PT-PR), que propõe reabrir a estrada do Colono, desativada desde 2003, no Parque Nacional de Iguaçu, é uma tentativa de “abrir um precedente para construir estradas em todos os outros parques nacionais do Brasil, onde houver interesse econômico”, adverte o chefe da área de conservação e manejo do Parque Nacional do Iguaçu em entrevista concedida à IHU On-Line. Segundo ele, o conceito de estrada-parque, apresentado pelo projeto de lei, “não existe no sistema brasileiro de unidades de conservação”. Trata-se de um modelo adotado na Europa e nos EUA, em parques que têm paisagens exóticas.
O projeto de lei, esclarece, pretende “criar uma legislação que altere o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC e criar a modalidade de estrada-parque apenas para uma estrada no país. Em nenhum outro lugar do Brasil esse conceito de estrada-parque se enquadra”. Apolonio Rodrigues (foto abaixo) explica ainda que a reabertura da estrada do Colono implica problemas ambientais ao Parque Nacional do Iguaçu, localizado no Paraná, um dos poucos remanescentes de Mata Atlântica do Brasil, “porque fragmentaria o parque e o território de espécies tradicionais, além de ser um vetor da entrada de espécies exóticas, caçadores, palmiteiros. Além disso, o próprio uso da estrada causaria o assoreamento dos cursos d’água, ou seja, problemas ambientais que vão contra os objetivos do Parque Nacional”.
Atualmente o Parque Nacional do Iguaçu é dirigido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, órgão federal responsável pela gestão das Unidades de Conservação do Brasil. Criado em 1939, e unido pelo rio Iguaçu ao Parque Nacional Iguazú, na Argentina, o parque integra o mais importante contínuo biológico do Centro-Sul da América do Sul, com mais de 600 mil hectares de áreas protegidas e outros 400 mil em florestas ainda primitiva.
Apolonio Rodrigues é graduado em Ciências Biológicas pela Faculdade Uniamérica, e atualmente é o chefe da área de conservação e manejo do Parque Nacional do Iguaçu.
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Confira a entrevista:
IHU On-Line – Como avalia o projeto de lei do deputado federal Assis de Couto (PT-PR), que está na pauta da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, o qual propõe a reabertura da estrada do Colono, no Parque Nacional do Iguaçu, a partir do conceito de “estrada-parque”?Apolonio Rodrigues – A Estrada do Colono, fazendo um retrospecto de sua história, foi utilizada durante muito tempo para ligar o oeste com o sudoeste do estado do Paraná através do Parque Nacional do Iguaçu. Era uma estrada de terra, trecho de uma rodovia federal, que estava sendo asfaltada, mas que quando chegou às margens do parque, uma ONG entrou com uma ação na Justiça para impedir o asfaltamento dentro do parque. Através dessa ação, a Justiça Federal determinou o fechamento da estrada por considerar que ela não tinha tanta importância, e poderia contribuir para a preservação do parque. O órgão gestor do parque à época era o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF, o qual foi arrolado como réu e teve de fechar a estrada. A partir daí instalou-se um conflito, e até hoje se discute a abertura ou não da estrada do Colono.
Hoje essa estrada não tem uma importância para os municípios envolvidos, segundo avaliação do fluxo de produção e da malha viária da região. Então, tudo que é produzido dos dois lados do parque, quando precisa ser exportado, tem saída a oeste, para a Argentina ou Paraguai, ou no sentido leste, para Paranaguá. Então, essa estrada é vista como um atalho que diminui a distância das pessoas que estão indo do sul para o norte, e que gostariam de cortar caminho por dentro do parque. Considerando a importância do parque para a humanidade, não se justifica a abertura da estrada para favorecer um grupo pequeno de pessoas.
Politicamente, esse conflito é uma fonte promissora de votos. A cada ano eleitoral os políticos conseguem mexer nessa história, e prometem que vão abrir a estrada para ganhar votos na região. Muitas pessoas já perceberam isso, e compreendem a situação como a questão da seca no nordeste. Todos os políticos acham que a seca é ruim, prometem resolvê-la, mas na verdade não resolvem o problema porque se esgotariam as fontes de votos.
Cientificamente, a estrada do Colono traz vários problemas para o Parque Nacional do Iguaçu, porque fragmentaria o parque e o território de espécies tradicionais, além de ser um vetor da entrada de espécies exóticas, caçadores, palmiteiros. Além disso, o próprio uso da estrada causaria o assoreamento dos cursos d’água, ou seja, problemas ambientais que vão contra os objetivos do Parque Nacional. O Parque tem uma legislação que visa a proteção integral dos recursos e a estrada não está prevista no plano de manejo.
PrecedentesO projeto de lei do deputado Assis de Couto quer criar uma estrada-parque, ou seja, uma modalidade de unidade de conservação, a qual não existe no sistema brasileiro de unidades de conservação. A lei Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC, que rege as unidades de conservação do Brasil, não prevê essa modalidade de estrada-parque. Então, o parlamentar quer criar uma legislação que altere o SNUC e crie a modalidade de estrada-parque apenas para uma estrada no país. Em nenhum outro lugar do Brasil esse conceito de estrada-parque se enquadra. Trata-se de um conceito europeu, parecido com as estradas cênicas americanas, ou seja, uma estrada com paisagens extraordinárias, com recantos onde as pessoas podem para contemplar a vista, fotografar, e que tenha em cada curva uma paisagem mais bonita que a outra. No caso brasileiro, a estrada do Colono é estreita, e não tem horizonte, só se vê uma paisagem monótona de arvores. Se você anda um quilômetro ou sete, é a mesma coisa, ou seja, não se encaixa no conceito de estrada-parque.
Por trás desse projeto está a questão de abrir um precedente para construir estradas em todos os outros parques nacionais do Brasil, onde houver interesse econômico. A história da Estrada do Colono é emblemática e outros parques poderão sofrer posteriormente, caso essa lei seja aprovada. Parques menores, que não têm as mesmas condições que as nossas de fiscalização, serão ainda mais suscetíveis a essas medidas. Então, em parques onde não se têm um efetivo que cuide, abre-se uma estrada e fica acessível à ocupação de todo mundo, pois infelizmente os nossos parques não têm um sistema de fiscalização como os dos EUA e nem a população brasileira está educada quanto a importância da conservação da natureza. O que parece adequado neste momento é tentar conservar da melhor forma possível para conservar esta última área, muito pequena, que conserva as espécies nativas da região.
IHU On-Line – Quais são os crimes ambientais e as pressões políticas mais recorrentes no Parque Nacional do Iguaçu?Apolonio Rodrigues – Há muitas pressões em torno do parque porque é uma das áreas mais férteis do mundo, sendo superprodutiva. Embora dentro do parque não há possibilidade de agricultura, o entorno é muito explorado. Na região, inclusive, existem partes voltadas à agricultura e à pecuária, o que afeta bastante os parques. Há muita caça, os caçadores entram no parque e por isso temos o problema da onça pintada. Coordeno um projeto que monitoramos os animais e temos acompanhado o declínio da espécie. Já perdermos quase 90% das espécies em 15 anos. É o último refúgio dessa espécie no Sul do Brasil, a qual está extinta por conta da caça no interior do parque. Embora tenhamos guias ambientais trabalhando conosco, não é suficiente para dar conta da vigilância. Trabalhamos também com a Polícia Federal, a Polícia Militar Ambiental, mas temos 420 quilômetros de divisa, ou seja, uma extensão difícil de monitorar.
Temos trabalhado muito a educação ambiental, e contado com a população para ajudar na conservação do parque e garantir toda a biodiversidade. A onça pintada é uma espécie indicadora da saúde do parque. Se essa população estiver saudável significa que está tudo bem, mas se ela um dia desaparecer teremos problemas seríssimos, inclusive os proprietários na volta do parque, pois não haverá o controle dos herbívoros, como capivaras que vão atacar o milharal e as produções.
ExtinçãoPara não extinguir a população de onças pintadas estamos trabalhando – de modo emergencial – juntamente com nossos colegas argentinos, já que a população de onças deles é maior, pois os parques estão conectados. A cada ataque que acontece nas propriedades da região, orientamos os proprietários a cuidarem de seus gados, pois como os ataques são recorrentes acabamos perdendo indivíduo por retaliação. A tentativa é evitar que os animais sejam mortos também fora do parque. Temos alguns êxitos, na semana passada, por exemplo, a Polícia Federal conseguiu prender cinco caçadores que mataram uma onça parda. Aos poucos temos conseguido reprimir um pouco a atividade aqui dentro.
Outra pressão que temos convivido é o projeto de construção de uma hidrelétrica a 500 metros do parque. Tanto a implantação quanto a operação da hidrelétrica vai afetar o regime hídrico do Rio Iguaçu e isso interfere muito nos processos das comunidades aquáticas, os peixes e as aves que estão associados ao rio. Trata-se de uma usina hidrelétrica fio d’água – Usina do Baixo Iguaçu -, cujos canteiros estão sendo implantados bem próximo ao parque. Isso causa impactos importantes, pois será removido solo do leito do rio, rochas, alteração das bordas, que vão acarretar o assoreamento do Iguaçu.
IHU On-Line – Qual a atual situação ambiental do Parque Nacional do Iguaçu no que se refere à preservação da vegetação da Mata Atlântica?Apolonio Rodrigues – Temos um parque que está dentro do bioma Mata Atlântica. Nós temos uma subdivisão que é uma floresta estacional onde tem quase todas as espécies que ocorrem na Mata Atlântica do Litoral, e espécies como Araucária, que é da região sul. O que está dentro do parque está muito bem conservado, pois não temos problemas de invasão para retirada de árvores, para ocupação de solo.
IHU On-Line – Deseja acrescentar algo?Apolonio Rodrigues – Recebemos anualmente mais de 1,5 milhão de pessoas no Parque Nacional do Iguaçu. Boa parte das pessoas é transportada por veículos de turismo da cidade e isso gera um conflito, porque o plano de manejo prevê que o transporte no parque seja feito pelas concessionárias do parque, as quais têm condições apropriadas. Mas há uma briga jurídica porque o trade turístico de Foz do Iguaçu insiste em transportar essas pessoas. Foi determinado pela Justiça Federal que a partir do dia 29 de dezembro esse transporte do trade não poderá entrar mais no parque, o que tem causado um desconforto grande entre nós do parque e a população, que se manifesta, inclusive, com faixas dizendo: “Fora Apolonio!”. Estamos esperando chegar dezembro, mas o pessoal já está se movimentando para tentar conseguir liminares para continuar entrando no parque. Os veículos que entram causam impactos, como as emissões de ruídos, de gases, poluição visual, atropelamento de animais. Nosso plano de manejo não prevê isso e estamos lutando há 12 anos para atender o plano e não conseguimos. Cada pouco que conseguimos para a preservação é uma conquista.
* Publicado originalmente no site IHU On-Line. (IHU On-Line)
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