Em entrevista para o Instituto CarbonoBrasil, membros do Projeto Coral Vivo detalham a situação dos corais brasileiros, que estão ameaçados por fatores como mudanças climáticas, sobrepesca e poluição
Os recifes de coral são ecossistemas fundamentais para toda a vida marinha, servindo de berçário e lar de diversas espécies. A degradação desses ambientes pode causar o colapso da cadeia alimentar e desequilibrar o funcionamento dos oceanos, com sérios impactos inclusive para a humanidade.
O Brasil não possui leis específicas para proteger seus corais, mas contamos com algumas ações e entidades que trabalham para garantir que esse ecossistema continue a cumprir seu importante papel.
Uma dessas entidades é o Projeto Coral Vivo, criado em 2003 e que faz parte da Rede de Projetos de Biodiversidade Marinha (BIOMAR), composta também pelo Tamar, Baleia Jubarte, Golfinho Rotador e Albatroz.
No último dia 19, o Coral Vivo divulgou que os corais na Baía da Ilha Grande, na Costa Verde Fluminense, estavam sofrendo com o branqueamento, um fenômeno relacionado com o aquecimento da água e acidificação dos oceanos.
Entramos em contato com o Coral Vivo para aprofundarmos um pouco mais esse tema, e Gustavo Duarte, coordenador executivo, e Teresa Gouveia, coordenadora de Educação Ambiental, concederam a entrevista a seguir:
Instituto CarbonoBrasil – O branqueamento dos corais é um dos fenômenos que pesquisadores mais costumam relacionar às mudanças climáticas. Vocês, que trabalham diariamente com os corais brasileiros desde 2003, têm percebido o agravamento desse problema nos últimos anos?
Gustavo Duarte - No Brasil ocorreu um grande evento em 2010, que foi observado desde o Rio Grande do Norte até o Rio de Janeiro. Antes disso, em 1997, os pesquisadores do Projeto Coral Vivo acompanharam um outro fenômeno equivalente. No mundo todo o problema vem se agravando, dando indícios de que devemos esperar por outros eventos de branqueamento nos próximos anos.
ICBr – No artigo que vocês divulgaram no dia 19 sobre o branqueamento na Baía da Ilha Grande, é afirmado que os corais devem se recuperar em seis meses. Por que essa recuperação acontece no Brasil, enquanto em outros países o branqueamento é algumas vezes definitivo ou demora vários anos para acabar?
Gustavo Duarte - Ainda não ficou esclarecida a razão de o Brasil apresentar baixas taxas de mortalidade em corais zooxantelados após o branqueamento. Há algumas hipóteses sendo testadas. No evento de 2010, um trabalho científico encontrou em torno de 10% de mortalidade nos corais brasileiros, enquanto o pesquisador Joel Creed, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, estudou o fenômeno na Ilha Grande e nos relatou números similares. Nas Maldivas, os eventos de branqueamento chegam a causar a morte de 80% dos corais. Essa diferença pode estar relacionada à intensidade do fenômeno no Brasil, a características dos nossos corais, ou a características oceanográficas da nossa costa.
ICBr – Depois de recuperados, os corais voltam à sua condição anterior ao branqueamento ou estão degradados e mais vulneráveis a novos problemas?
Gustavo Duarte – A coloração de alguns corais brasileiros retorna em torno de seis meses depois do evento, segundo acompanhamento realizado por Álvaro Migotto, da Universidade de São Paulo. No entanto, já há inúmeros estudos relacionando o branqueamento à incidência de doenças, já que os corais perdem importantes compostos que as algas zooxantelas produzem. Portanto, os corais ficam mais vulneráveis quando estão branqueados.
ICBr – Qual é o cenário da situação atual dos corais brasileiros? Além do branqueamento, que outras ameaças esses ecossistemas enfrentam?
Gustavo Duarte - Os corais estão ameaçados pela sobrepesca, pela poluição costeira, pelas mudanças climáticas, por doenças de várias origens, inclusive humanas, pela extração ilegal, pela pesca com dinamite e pelo turismo desordenado.
ICBr – Vocês acreditam que o governo, a iniciativa privada e a própria sociedade têm feito o suficiente para proteger os corais brasileiros?
Gustavo Duarte - O Brasil não tem uma política pública específica para os recifes de coral, apenas ações diversas relacionadas ao tema. Entretanto, grande parte dos principais recifes brasileiros está em unidades de conservação federais. Apesar da falta de políticas específicas, acontecerá em Arraial d’Ajuda, Bahia, de 07 a 11 de abril, a oficina de elaboração do Plano de Ação Nacional para Conservação dos Ambientes Coralíneos do Brasil – PAN Corais. A oficina será realizada por intermédio de uma parceria do CEPSUL/ICMBio com o Projeto Coral Vivo, e esperamos que seu resultado seja um divisor de águas para a conservação recifal no nosso país. Várias espécies ameaçadas como peixes, corais, crustáceos e equinodermos serão contempladas neste Plano de Ação.
ICBr -Vocês trabalham bastante com a conscientização ambiental de crianças; podemos ter esperança de que as novas gerações serão mais engajadas na proteção da natureza?
Teresa Gouveia - A rica diversidade cultural da sociedade brasileira impõe um olhar igualmente diverso quanto a educação de crianças e jovens brasileiros. O ensino formal, ao acompanhar as dinâmicas sociais que constroem olhares sobre questões ambientais, nos permite uma avaliação positiva quanto ao engajamento infantojuvenil nas ações para conservação da natureza. Contudo, ao considerarmos a necessária conservação e sustentabilidade socioeconômica de ambientes marinhos, estamos num processo crescente, porém ainda tímido. Os esforços têm sido efetuados no sentido de informar, sensibilizar, enfim, de educar esse público para, por fim, propiciar a todos o papel que desempenharão quando partícipes desse esforço, que deve ser de todo e qualquer brasileiro, independente de seus vínculos socioculturais com ambientes marinhos como os recifes de corais. Esse é o caminho que trilha o Projeto Coral Vivo.
ICBr -O que o Coral Vivo tem planejado para este ano?
Gustavo Duarte - Acabamos de assinar nosso terceiro contrato com a Petrobras por meio do Programa Petrobras Ambiental. Então, nos próximos três anos, iremos realizar uma série de atividades envolvendo as nossas três vertentes – pesquisa, educação e mobilização social. São inúmeras ações, e irei enumerar aqui algumas delas. Por meio da Rede de Pesquisas Coral Vivo apoiaremos atividades de campo de 24 projetos de pesquisadores associados na Costa do Descobrimento, incluindo pesquisas no mesocosmo marinho (foto), que é um sistema experimental para estudar os efeitos de mudanças climáticas e a qualidade da água sobre organismos recifais brasileiros, e também iremos fazer o mapeamento físico e biológico dos Recifes Araripe e Coroa Alta, em Santa Cruz Cabrália.
No Programa de Extensão Universitária (Proex), iremos receber 45 estudantes em regime de internato, por aproximadamente 25 dias, para nos acompanharem e auxiliarem nas nossas atividades. Já por intermédio da Rede de Educação Ambiental Coral Vivo, apoiaremos atividades de educação ambiental de escolas públicas selecionadas no extremo Sul da Bahia.
Além da forte atuação na discussão e formulação em políticas públicas, com presença em conselhos de meio ambiente e de unidades de conservação no Sul da Bahia e do Plano de Ação Nacional para Espécies Ameaçadas de Ambientes Recifais (PAN Corais), mantemos um contato contínuo com a sociedade no Espaço Coral Vivo Mucugê, no Centro de Visitantes e Base de Pesquisas do Coral Vivo no Arraial d’Ajuda Eco Parque, e também nas redes sociais.
Os interessados em mais informações sobre as nossas atividades podem acessar o nosso site www.coralvivo.org.br e a página no Facebook www.fb.com/CoralVivo.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.
(CarbonoBrasil)