As perspectivas do pré-sal, artigo de José Goldemberg
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As perspectivas do pré-sal, artigo de José Goldemberg


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[O Estado de S.Paulo] Os problemas financeiros e administrativos da Petrobras, com indícios de irregularidades em investigação pela Polícia Federal e o Ministério Público Federal, têm sido amplamente discutidos recentemente e não vou repeti-los aqui.
Frequentemente, investimentos equivocados dão prejuízos maiores do que os resultantes da corrupção. No caso da Refinaria de Pasadena, por exemplo, seria o caso de perguntar por que comprá-la, mesmo que se tratasse de “um bom negócio”. A Petrobras teria sido criada para realizar esse tipo de atividade?
O que vamos fazer é analisar a estratégia adotada pela Petrobras e pelo governo federal de concentrar todos os esforços da empresa na exploração do petróleo em grandes profundidades no oceano, já que as reservas de petróleo “convencional” estão se esgotando, como já aconteceu em muitos países e ocorre agora, na Bacia de Campos.
Para enfrentar esse problema, as empresas petrolíferas procuram desenvolver técnicas para retirar petróleo de reservas “não tradicionais”, como areia asfáltica no Canadá ou exploração em grandes profundidades nos oceanos. O petróleo “não convencional” é mais difícil de produzir e, consequentemente, o seu custo é mais elevado. Sucede que as empresas de petróleo acreditam que a demanda por petróleo vai continuar crescendo e que os preços do produto vão aumentar, o que justificaria a exploração em áreas mais difíceis e problemáticas.
No Brasil, a Petrobras concentra seus esforços nos depósitos chamados de pré-sal, situados no oceano a grandes profundidades (mais de 5 quilômetros), abaixo de uma camada de sal de cerca de 2 quilômetros de espessura. Essa estratégia enfrenta três desafios: problemas técnicos e econômicos; problemas ambientais; e as alternativas ao uso do petróleo.
Localizar petróleo nas profundezas do oceano é uma coisa, trazê-lo para a superfície e leva-lo até uma refinaria é outra. O otimismo permanente da Petrobras, de que todos esses problemas vão ser resolvidos, não ajuda muito – nem a falta de transparência sobre os custos do petróleo produzido. Estimativas não oficiais são de que eles seriam superiores a US$ 50,00 por barril produzido. Em comparação, o petróleo “convencional” custa menos de US$ 10,00 por barril para ser produzido, e o fato de ser vendido a mais de US$ 100,00 por barril é consequência de acordos políticos e comerciais dos principais produtores.
Os problemas ambientais da exploração de petróleo em grandes profundezas são, na realidade, “terra incógnita”. Não há muita experiência prévia das companhias internacionais nesta área e a liderança da Petrobras em exploração em águas profundas traz consigo problemas novos. Prudência e humildade seriam uma boa estratégia a seguir nessa área.
Quanto a acidentes na produção de petróleo, é útil comparar as experiências de Estados Unidos, Noruega, Inglaterra e Brasil.
As empresas de petróleo classificam acidentes em várias categorias: segurança ocupacional, colisões, pequenos incêndios e perda total de poços de petróleo. Os Estados Unidos, por causa do acidente da British Petroleum no Golfo do México, têm o pior desempenho em todas as categorias. O Brasil, no entanto, é o pior em colisões e pequenos incêndios. E a Noruega é o líder em segurança.
Os custos elevados na produção de petróleo “não convencional” são o calcanhar de aquiles da estratégia de explorar esse petróleo e pode justamente inviabilizá-la, porque tornam mais competitivas as alternativas ao petróleo.
E quais são essas alternativas?
A primeira delas – e a mais simples – é o aumento da eficiência dos motores usados na indústria automobilística. Tanto a União Europeia quanto os Estados Unidos fixam de tempos em tempos, desde 1980, a quilometragem média por litro de combustível que os veículos automotores devem atingir. Por exemplo, nos Estados Unidos, ela foi fixada em 10,6 quilômetros por litro em 1975; deveria atingir 16,6 quilômetros por litro em 2016; e deverá atingir 23 quilômetros por litro em 2025. Com isso, se a frota não aumentar muito, o consumo de derivados de petróleo diminui.
A segunda é a produção de biocombustíveis como o etanol da cana-de-açúcar, no Brasil, e de milho, nos Estados Unidos. Atualmente, eles substituem 3% do petróleo que é consumido no mundo, mas essa porcentagem poderá facilmente atingir 10%. Há, aqui, uma grande oportunidade para o Brasil exportar sua tecnologia de produção de cana-de-açúcar e de produção de etanol, que já atingiu elevado nível de produtividade.
Grandes empreendimentos em produção de petróleo “não convencional”, como o pré-sal, têm grandes riscos. Alternativas existem e elas deveriam ser implementadas com a mesma energia e determinação com que a Petrobras procura retirar petróleo de grandes profundidades do oceano. O que a prudência recomenda é que a Petrobras deveria tentar reduzir os seus custos e dividir os riscos com outras empresas petrolíferas mundiais com experiência nessa área.
Contudo, o que estamos presenciando nas políticas adotadas pelo governo brasileiro na área de petróleo desde 2008 é exatamente o oposto. A Petrobras ficou praticamente sozinha na exploração do pré-sal, endividando-se enormemente a ponto de suas ações terem perdido cerca de 80% do seu valor. Contribuiu para isso o congelamento dos preços de derivados de petróleo, o que levou a empresa a vender gasolina com prejuízo e, nesse processo, asfixiando o Programa do Álcool de cana-de-açúcar.
Esse não é o caminho a seguir e uma correção de rumos torna-se cada vez mais urgente.
*José Goldemberg é professor emérito da Universidade de São Paulo, foi secretário de Ciência e Tecnologia da Presidência da República.
** Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo e reproduzido pelo EcoDebate, 22/05/2014





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