Foto: Shutterstock
Foto: Shutterstock
Nos últimos anos, temos assistido a grandes retrocessos na política socioambiental brasileira. Aprovado há mais de dois anos com diversas concessões à bancada ruralista no Congresso Nacional, o novo Código Florestal (Lei 12.651/12) é o exemplo mais claro desse movimento que busca o enfraquecimento da legislação ambiental em prol de interesses de grupos pontuais.
Os que apoiam os retrocessos argumentam que o movimento ambientalista explora um debate ideológico dessas questões, e que esse debate seria distante, por exemplo, da realidade dos produtores agrícolas brasileiros e da necessidade mundial de produção de alimentos. Um argumento, porém, ilusório, pois a ciência já comprovou que a conservação das áreas de vegetação nativa é fundamental para a proteção da biodiversidade e para a disponibilidade de serviços ambientais essenciais a todos, incluindo a produção de alimentos. Apesar disso, o que se vê são decisões políticas que ignoram os pareceres técnicos e o conhecimento de pesquisadores e especialistas.
Enquanto o Código Florestal tramitava no Congresso Nacional, campanhas organizadas inicialmente pelo movimento ambientalista levaram ao debate público a discussão sobre a Lei, antes árida e técnica. A ideia era envolver a sociedade na discussão sobre os riscos que as alterações propostas traziam à população e ao meio ambiente. O resultado: um debate rico, com participação da academia, ONGs, políticos, personalidades de diversas áreas e uma sociedade mobilizada que promoveu campanhas nas redes sociais e nas ruas contra as mudanças da legislação, tudo com grande cobertura e repercussão na imprensa. A mobilização não impediu o retrocesso de pontos importantes da Lei, mas contribuiu para a garantia de algumas ferramentas, como o Cadastro Ambiental Rural (CAR), e reforçou a importância do envolvimento da sociedade em questões discutidas no Congresso, acompanhando de perto a atuação dos nossos governantes e parlamentares em relação aos temas ambientais.
Nesse sentido, destaca-se a atuação da Frente Parlamentar Ambientalista, que reúne deputados e senadores interessados em discutir as pautas relativas ao meio ambiente, bem como acompanhar os processos legislativos e outras atividades do Congresso Nacional que apresentam relação, direta ou indireta, com a questão.
A Frente Parlamentar Ambientalista foi criada pela primeira vez em 1987, com o objetivo de incluir a pauta ambiental nas discussões que levaram à Constituição de 1988. Entre suas conquistas estão o capítulo sobre o Meio Ambiente na Constituição e a inclusão de alguns biomas – entre eles a Mata Atlântica – como Patrimônios Nacionais. Além disso, a participação mais efetiva da sociedade civil organizada na Frente, a partir de 2007, já produziu resultados práticos, como a aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, que passou quase vinte anos sendo discutida sem consenso.
Dentro da Frente está também o Observatório Parlamentar Socioambiental, que monitora os projetos de lei em tramitação no Congresso referentes à área. Seu objetivo é acompanhar a atividade legislativa e ajudar a promover o desenvolvimento sustentável, oferecendo ao cidadão brasileiro um roteiro sobre o funcionamento do Congresso e o trâmite das leis de forma resumida e de fácil compreensão, além de alguns estudos apresentados nos principais debates ambientais. Em suma, a ideia é aproximar o cidadão comum da esfera em que as leis ambientais são discutidas e as decisões sobre elas são tomadas.
Apesar desses esforços, o enfraquecimento da agenda ambiental no país continua, o que fica visível na falta de incentivo do Estado em efetivar o desenvolvimento sustentável, seja em investimentos em conservação, fiscalização ou aplicação de políticas públicas já definidas. Os Planos Municipais de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica, previstos na Lei da Mata Atlântica sancionada pelo governo federal em 2006, são exemplos de políticas que merecem maior atenção e investimentos para sua criação.
Outro sintoma é a desaceleração nos processos de criação de Unidades de Conservação (UCs), instrumentos mundialmente reconhecidos para a conservação e uso sustentável de recursos naturais. E o que falar da crise hídrica, que em 2014, durante o processo eleitoral, ficou praticamente de fora dos debates?
Neste início de 2015, a Frente Parlamentar Ambientalista já selecionou as pautas que serão prioritárias nesta nova legislatura, a exemplo da crise hídrica. Este foi inclusive o tema do primeiro café da manhã do ano organizado pela Frente na Câmara dos Deputados e que reuniu parlamentares, especialistas, secretários estaduais de Meio Ambiente e representantes de organizações da sociedade civil para um debate. Na ocasião, foi anunciada também a criação do “Comitê Gestor da Crise da Água no Brasil”, que levará ao Plenário mais discussões sobre soluções e enfrentamento da crise.
Outro tema prioritário ao grupo será a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 504/10, que pretende elevar o Cerrado e a Caatinga à condição de patrimônio nacional. Esses dois biomas representam juntos um terço do território brasileiro, sendo que a Caatinga é o único exclusivamente brasileiro. O texto encontra resistências na bancada ruralista no Congresso.
Ainda em relação ao Cerrado, o grupo quer prioridade para o PL 7338/14, que trata da conservação e da utilização sustentável da vegetação nativa deste bioma. Esse projeto ainda precisa ser analisado pelas comissões temáticas antes de ser votado no Plenário.
Outro ponto de atenção da Frente Ambientalista é a PEC 215/00, que transfere do Poder Executivo para o Congresso Nacional a prerrogativa de criar e modificar limites de terras indígenas, de quilombolas e áreas de proteção ambiental.
Para completar, a Frente Parlamentar Ambientalista acompanhará com atenção a aplicação das regras do CAR. De acordo com dados do Ministério do Meio Ambiente (MMA), até o momento foram registrados pouco mais de 132,2 milhões de hectares, um terço (35,5%) do total estimado para cadastramento, que é 371,8 milhões de hectares. O limite para o preenchimento do CAR vai até o próximo 5 de maio e esse monitoramento é essencial para cobrar do MMA que não haja alterações nesse prazo.
Já é de entendimento de todos o quanto é imprescindível proteger a vegetação e, sobretudo, cobrar dos nossos governantes políticas mais efetivas para a conservação e recuperação das nossas florestas e ambientais naturais. Cabe agora ampliar a participação da sociedade nessa causa e no debate sobre as principais questões ambientais do nosso país. A luta continua!
* Mario Mantovani é diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica
** Publicado originalmente no site SOS Mata Atlântica.
(SOS Mata Atlântica)