O Lago Chade já ocupou 25 mil metros quadrados de área, mas no último século diminuiu 90%. Foto: Mustapha Muhammad/IPS
Gulfe, Camarões, 15/2/2013 – Ao se aproximar da bacia do Lago Chade, tendo partido da pequena localidade camaronesa de Gulfe, a atmosfera de desespero se faz palpável. Ar poeirento, ventos ferozes e implacáveis, plantas que murcham e dunas sugerem que esta área outrora exuberante sofre uma mudança drástica. A vegetação escassa só é interrompida pela ocasional presença de árvores definhadas e algumas matas chamuscadas.
Vizinho a Chade, Camarões, Níger e Nigéria, o Lago Chade ocupou no passado 25 mil quilômetros quadrados, mas no último meio século diminuiu em 90%. Pela falta de chuvas, os rios Chari e Logno, os dois principais que alimentam o Lago, fornecem menos água a cada ano. Criadores de gado, pescadores e agricultores, que por várias gerações tiraram seu sustento do rico solo desta bacia, agora se esforçam para sobreviver, enquanto o grande lago seca diante de seus olhos.
Nas margens do Chade, Mahamat Aboubakar retira um pequeno bagre negro de uma enorme rede. “Antes, era necessário lançar a rede poucas vezes para obter milhares de pescados. Agora, para conseguir a mesma quantidade pode ser preciso um dia de trabalho”, afirmou, apontando para sua mísera captura, pela qual conseguirá cerca de dois dólares que, provavelmente, serão sua única renda do dia. Quando o Lago estava saudável, este pescador de 64 anos podia ganhar até US$ 50. Agora, só pode esperar que sua captura diminua, e que ele mesmo empobreça, já que as águas do lago continuam baixando.
“Isto é um desastre”, disse Sanusi Imran Abdullahi, diretor executivo da Comissão da Bacia do Lago Chade, órgão regional criado pelos países que fazem limite com o lago a fim de regular o uso de sua água e de outros recursos naturais da área. “Isto já está fazendo vítimas entre os moradores da região”, afirmou Imran à IPS. Para impedir uma situação potencialmente catastrófica, “trabalhamos para salvar o Lago Chade e os 30 milhões de pessoas cujo sustento depende de seus recursos naturais”.
É impossível culpar pela crise apenas um fator, dizem os especialistas. O ambientalista Paul Ghogomou, da Universidade de Iaundé, disse à IPS que “são responsáveis a desertificação e a mudança climática, bem como o contínuo desvio de água dos rios que alimentam o Lago”. Para ele, a água do camaronense Rio Chari (que é alimentado pelo tributário Rio Logono, fornece cerca de 90% da água do Lago Chade) é desviada para projetos de irrigação na área. Enquanto isso, represas construídas sobre os rios Jama’are e Hadejia, no nordeste da Nigéria são “em parte responsáveis pela redução” do Lago, disse Ghogomou.
Abdullahi, da Comissão da Bacia do Lago Chade, acrescentou que a pressão exercida pela população também está levando o lago ao limite. “Há 40 anos, a população da área era de aproximadamente 17 milhões de pessoas. Agora, contabilizamos cerca de 30 milhões. Assim, a maior demanda por parte da população, o aumento das cabeças de gado e a evaporação maciça devido à mudança climática se combinaram para reduzir o lago”, explicou.
No momento, agricultores e pescadores demonstram resiliência, se adaptando o melhor que podem à crise. Ahmadou Bello, um pescador de Gulfe, simplesmente passou a se dedicar à agricultura, produzindo feijão-caupi, milho, arroz e pimentas sem usar fertilizantes. Orgulhoso de sua próspera fazenda, disse à IPS que o lago “deixou para trás terra muito fértil”. E, se o lago não voltar, inclusive a umidade remanescente se evaporará, e os agricultores terão poucas opções para ganhar a vida.
Em um esforço para implantar soluções mais sustentáveis, países-membros da Comissão, como Chade, Camarões, Níger, Nigéria e República Centro-Africana, desenvolveram um ambicioso plano para voltar a encher o lago com água do Obangui, um tributário do Rio Congo. Segundo Abdullahi, o projeto implicará a “construção de uma represa de contenção em Palambo”, para que sirva como área de captação. A água será bombeada para o Rio Fafa, afluente do Ouham, e, por força da gravidade, atravessará um canal de 1.350 quilômetros de comprimento até o Rio Chari, em Camarões, e depois chegará ao Lago Chade.
“No Congo há muita água que vai para o oceano. Simplesmente vamos tomar uma fração da mesma para salvar as vidas de 30 milhões de pessoas que dependem do Lago Chade para sobreviver”, pontuou Abdullahi. “O programa não está desenhado só para levar água ao lago Chade, mas também para melhorar a atividade econômica e o sustento dos habitantes da bacia do Congo”, acrescentou.
Entretanto, é provável que a escassez de dinheiro atrase a implantação do projeto. Segundo Abdullahi, o programa está orçado em US$ 14,5 bilhões. Embora os chefes de Estado da região mostrem certo compromisso político, a Comissão busca ajuda na comunidade mundial. “No começo deste ano, realizaremos uma conferência internacional de doadores para ver o que podemos conseguir, e a partir daí avaliaremos quais Estados-membros contribuirão”, explicou.
É provável que a maior parte dos fundos proceda do setor privado, desde que os que contribuírem tenham garantido um retorno sobre seu investimento. “Estou certo de que estarão interessados”, declarou, otimista, Abdullahi. O custo do projeto pode parecer assustador, mas o custo da falta de ação pode ser muito mais devastador, afirmam especialistas. Segundo a firma canadense Cima-International, que realizou estudos de viabilidade sobre o projeto de transferência de águas, o Lago Chade poderá desaparecer totalmente até 2025 se nada for feito para salvá-lo. Envolverde/IPS
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