Universo Energético
Água: vantagem competitiva para o Brasil
Mata Atlântica. Foto: SOS Mata Atlântica
Ter acesso a 12% de toda a água doce superficial do planeta e a alguns dos maiores aquíferos já mapeados dá ao Brasil uma posição potencialmente privilegiada na economia global.
Por Dal Marcondes, da Envolverde*
O Brasil é o país com uma das maiores reservas de água doce mapeadas no planeta e que não se encontram em geleiras ou lugares inatingíveis. São águas com acesso relativamente fáceis, além de ter, em seu território, um regime hídrico bastante amigável. Quase todo o território é banhado por rios perenes e com bom volume hídrico, o que facilitaria, ao menos em tese, a distribuição da produção agrícola e industrial por todo o país. No entanto, os mananciais brasileiros estão em situação deplorável, assoreados, poluídos, vítimas principalmente da carência de sistemas urbanos de tratamento de esgotos e da má gestão de resíduos, que ainda espalha lixões pelas beiras de cursos d’água.
Essa fartura de água permite ao país exercer um papel de liderança principalmente na exportação de commodities agrícolas, exemplos disso são a soja e carne bovina, produtos que exigem grandes quantidades de água em seu ciclo de produção. Além disso, pela grande disponibilidade de terras férteis, também facilita a produção de álcool de cana de açúcar, uma das primeiras atividades econômicas do Brasil colônia, e que hoje ainda prospera pelo uso do produto como combustível. No entanto essa vantagem comparativa com países que tem muito menos disponibilidade da água ainda não se reflete em setores estratégicos para o Brasil, como a estruturação de uma “biocivilização”, como propõe o economista Ignacy Sachs.
As vantagens naturais o Brasil estão baseadas principalmente na farta disponibilidade de água, energia limpa, um importante parque mineral e uma biodiversidade invejável, inclusive com variedade de biomas. A biocivilização preconizada por Ignacy Sachs é, sem dúvida, a transição de modelo necessária para que o Brasil faça sua revolução em direção a um modelo econômico não antropofágico. Sachs acredita que a produção e usos de biomassas podem alavancar uma modelagem econômica com novas empresas e novas tecnologias, com mais distribuição de renda pelo trabalho e com uma imensa capacidade de regeneração de biomas e ecossistemas.
O economista vê biomassa como materiais para quase todos os usos que a humanidade possa precisar. São matérias-primas florestais para energia e indústria, biotecnologia de base para o desenvolvimento de produtos, bioenergia a partir de celulose, o que transforma qualquer resíduo vegetal em combustível e assim por diante. Sachs insiste que o Brasil tem as melhores características possíveis para liderar essa transição para um modelo econômico limpo, de alto valor social e baixo impacto ambiental, justamente por dispor dos recursos naturais necessários, principalmente água e biodiversidade.
Muitos ambientalistas fazem a crítica ao modelo exportador por conta dos volumes de água necessários aos ciclos de vidas dos produtos, principalmente agropecuários. No entanto, os volumes de água necessários à produção não são exportados com o produto. O que se exporta são os serviços prestados pela água. Mas, para que isso seja sustentável é necessário que os mananciais de água sejam bem tratados, de forma a não criar disputas entre os diversos usos do insumo, principalmente não comprometendo o abastecimento das pessoas.
Uma transição econômica que valorize os processos naturais de produção, ou a biocivilização preconizada por Sachs, tem o potencial de levar parte de seus processos e de sua geração de renda para os rincões de miséria do país. Seria preciso trabalhar em todas as potenciais áreas agrícolas e com tecnologias menos agressivas em termos de uso do solo. O mundo precisará de mais especialistas em ciências da vida, em conhecimentos tradicionais e em gestão de processos e pessoas. Principalmente, uma economia limpa deverá ter a capacidade de inovar em situações onde o conhecimento tradicional está cristalizado.
A busca da ciência e da tecnologia necessárias para a transição para uma economia de baixo carbono pode ser a alavanca necessária para melhorar a performance do sistema educacional. Pode, também, representar um novo complexo industrial capaz de absorver milhões de trabalhadores em áreas pobres. O direcionamento de universidades e centros de pesquisa para o estudo objetivo da transformação da economia em direção ao aproveitamento da água e da biodiversidade brasileira pode ser um caminho, inclusive, para a superação da crise econômica do país.
Uma economia que tenha a água e os recursos naturais do país como vetores de desenvolvimento não precisará ficar centralizada em grandes metrópoles que se tornaram verdadeiros sorvedouros de recursos naturais e usinas de emissões de gases estufa. Pelo contrário, promoveria uma melhor distribuição da população pelo território, o que geraria muito mais qualidade de vida.
Há que se lembrar que em plena sociedade do conhecimento, com as tecnologias de comunicação evoluindo a velocidades exponenciais, a proximidade das pessoas não se dá apenas pelo aperto de mão, mas também pelo contato cotidiano pela internet e redes sociais. (#Envolverde)
* Dal Marcondes é jornalista, diretor da Envolverde, passou por diversas redações da grande mídia paulista, como Agência Estado, Gazeta Mercantil, revistas IstoÉ e Exame. Desde 1998 dedica-se à cobertura de temas relacionados ao meio ambiente, educação, desenvolvimento sustentável e responsabilidade socioambiental empresarial.
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